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Flu pode ser 1º rebaixado campeão na "era dos pontos corridos"

26 nov 2010 - 10h00
(atualizado às 11h20)
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Na briga para conquistar o Campeonato Brasileiro deste ano, o Fluminense pode ser o primeiro time já rebaixado a ser campeão nacional na "Era dos Pontos Corridos", exatamente dez anos depois de participar da última virada de mesa a favor de grandes clubes no País. Para lograr o feito, a equipe precisa vencer o Palmeiras no domingo e torcer por tropeços de Corinthians e Cruzeiro, os únicos concorrentes com chance de tirar-lhe a taça.

Em 2000, graças a uma disputa judicial envolvendo o Gama-DF, o Clube dos 13 organizou a chamada Copa João Havelange com três módulos, em que todos os times poderiam disputar o titulo. Na prática, a medida trouxe de volta à elite o Fluminense e o Bahia (Juventude, América-MG e Gama também ganharam uma vaga no Módulo Azul, a primeira divisão da época).

A competição de 2000 marcou o fim do pior período da história tricolor. Entre 1996 e 1999, em meio a sucessivas brigas internas, trocas de diretoria e más administrações, o Fluminense chegou ao fundo do poço. Após ser rebaixado dentro de campo no Brasileiro de 1996, o clube das Laranjeiras conseguiu, por meio de uma "virada de mesa", voltar à primeira divisão do torneio no ano seguinte. No entanto, com os mesmos erros de administração, foi rebaixado novamente na competição de 1997, e desta vez não conseguiu escapar de atuar na Série B na temporada de 1998.

A situação que parecia não poder piorar se tornou mais grave com a má campanha na segunda divisão e a consequente queda à Série C do Campeonato Brasileiro. Apenas a partir daquele momento, com um time com jovens como Roger, Paulo César, Roni e Magno Alves, sob o comando do tetracampeão mundial Carlos Alberto Parreira, o clube tricolor conseguiu reagir dentro de campo, conquistando a terceira divisão de 1999. Porém, em vez de completar o ciclo de retorno disputando a Série B, o Fluminense aproveitou a manobra de bastidores que criou a Copa João Havelange para encurtar seu pesadelo.

Carlos Alberto Parreira comandou o Fluminense na conquista do título brasileiro de 1984 e iniciou a retomada com a Série C de 1999. Depois de enfrentar times como Unibol e Dom Pedro II na terceira divisão, o ex-técnico da Seleção Brasileira fala com satisfação do atual momento vivido pelo clube. "Nesse ano, teve planejamento, o patrocinador abriu os cofres e fez um bom time, talvez o melhor do campeonato. Fico feliz quando há planejamento, investimento e trabalho. É muito bom quando tudo isso é reconhecido através do título. O Fluminense mostrou que nesse ano o trabalho foi muito bem feito", disse.

Além da fase dramática vivida entre 1996 e 1999, o Fluminense pôde usar como exemplo sua própria trajetória no Campeonato Brasileiro de 2009, quando penou para escapar de um novo rebaixamento. "Eles aprenderam com as dificuldades do ano anterior. O Cuca fez quase um milagre. O Fluminense tinha 99% de chance de cair a seis rodadas do final. O time ganhou tudo e foi quase um milagre não ter caído para a segunda divisão", disse Parreira, fã do técnico Muricy Ramalho. "É um técnico super experiente, dos melhores do Brasil", afirmou o comandante.

Com 65 pontos ganhos, um a mais que o Corinthians, o Fluminense lidera o Campeonato Brasileiro. Nas duas rodadas finais, enfrenta o Palmeiras, abalado com a eliminação na Copa Sul-Americana, e o Guarani, praticamente rebaixado. Desta forma, Parreira acredita que Muricy Ramalho tem grandes chances de se tornar o segundo treinador a ganhar um Brasileiro com o Fluminense. "Ainda não está definido, mas a vantagem é grande e eu aposto nessa vantagem. É um time bem montado e que liderou o torneio por mais vezes. Os matemáticos apontam que o Fluminense tem 64% de chances de título, e é isso que vai acabar acontecendo", arriscou.

O drama do Fluminense começou em 1996, quando Parreira ainda colhia os louros do tetracampeonato mundial logrado com a Seleção em 1994. Um ano depois de ver Renato Gaúcho estragar o centenário do Flamengo com a barriga, o torcedor tricolor chorou a queda no Campeonato Brasileiro, resultado de uma campanha de 22 pontos em 23 jogos. No entanto, pouco antes do inicio do torneio nacional de 1997 a CBF usou o escândalo de arbitragem protagonizado por Ivens Mendes como pretexto para virar a mesa e recolocar o clube tricolor na elite. Com champanhe, Álvaro Barcellos, então presidente, comemorou, em um marco da imoralidade que reinava no futebol da época.

Apesar de permanecer na elite, o Fluminense repetiu os erros no Brasileiro de 1997, e acabou rebaixado novamente após ganhar os mesmos 22 pontos em 25 partidas. Roni, atualmente no Vila Nova, era um dos atacantes da equipe. "O time era experiente. Tinha o Paulo Roberto, o Leandro Ávila, jogadores acostumados a jogar em grandes clubes. Eu acho que eu era o único jovem ali. Mas a falta de interação entre os jogadores foi um dos nossos problemas. O time demorou a perceber que podia ser rebaixado novamente, e eu também acho que havia uma certa acomodação pela virada de mesa de 1996", admitiu o atleta.

Sem nova marmelada, o Fluminense foi obrigado a disputar a Série B na temporada de 1998. Como na década de 1990 ver um time grande na Segunda Divisão era raridade, o clube tricolor não soube como se preparar para a disputa e menosprezou o torneio. Logo na primeira rodada, diante de mais de 30 mil pessoas no Maracanã, em um jogo marcado para as 11h, o time perdeu do ABC-RN por 3 a 2. As vaias dos torcedores na ocasião serviram como prenúncio de um novo fracasso, já que a equipe acabou rebaixada para a Série C, na época a última divisão do futebol brasileiro.

"Na segunda divisão, nós tínhamos um time médio. A diretoria achou que não precisaria investir muito no elenco e o time não fez uma pré-temporada adequada. O time ficou treinando nas Laranjeiras e acharam que seria fácil. Logo na primeira rodada, com 40 mil pessoas no Maracanã (na verdade, o público pagante foi de 18.511 torcedores, mas estima-se que 30 mil pessoas estiveram naquela partida), a gente perdeu para o ABC-RN e vimos que as coisas não seriam daquela maneira. A verdade é que ninguém estava acostumado (a disputar a segunda divisão)", afirmou o atacante Roni.

Na Série C, após as renúncias de Gil Carneiro de Mendonça e Álvaro Barcellos, David Fischel assumiu a presidência para iniciar a reestruturação. Neste contexto, a contratação do técnico Carlos Alberto Parreira para dirigir a equipe foi fundamental, segundo os jogadores da época. "Com a chegada dele, as coisas mudaram muito. Houve uma melhora muito grande, os salários eram pagos em dia e o Parreira montou um time para aquela situação, para ganhar aquele campeonato", recordou Roni. No último jogo do quadrangular final do torneio, o meia Roger, grande revelação da equipe, marcou os gols da vitória por 2 a 1 sobre o Náutico, no Estádio dos Aflitos.

Com o acesso à Série B de 2000 garantido, o Fluminense foi beneficiado por nova "virada de mesa", a última do futebol nacional. Desta vez, a brecha foi aberta por uma ação judicial impetrada pelo Gama-DF, que contestava seu rebaixamento no ano anterior, consequência de medidas do STJD a favor do Botafogo na escalação irregular do atacante Sandro Hiroshi, então jogador do São Paulo. Na prática, o time das Laranjeiras voltou à primeira divisão ao disputar o Módulo Azul da Copa João Havelange, no qual caiu apenas diante do São Caetano, futuro vice-campeão, nas oitavas de final.

O atacante Magno Alves, atualmente no Ceará, defendeu o Fluminense entre as temporadas de 1998 e 2002. Desta forma, o atacante viveu de perto tanto a fase caótica quanto a retomada dos bons resultados. "Da Copa João Havelange em diante, a mudança no Fluminense foi de 180 graus. Nós saímos da Série C para a primeira divisão, fomos terceiro colocados (no Campeonato Brasileiro) em 2001, campeões cariocas em 2002", enumerou o atacante. Além das campanhas citadas pelo jogador, o clube tricolor foi quarto colocado no Torneio Rio-São Paulo de 2001 e na edição de 2002 do Brasileiro.

Campeão da Copa do Brasil de 2007 e vice da Libertadores de 2008, o Fluminense voltou a flertar com a Série B em 2009. Em 2010, dez anos após a "virada de mesa" que o levou à primeira divisão, o clube tem a torcida de antigos personagens para triunfar. "Estamos torcendo por eles. Depois de cinco anos que passei no clube, tive um carinho muito grande dos torcedores. Agora, temos que esperar as últimas rodadas", disse Magno Alves, acompanhado por Roni. "O torcedor, mais do que ninguém, merece esse título. Eles sofreram bastante durante todos esses anos e com certeza seria muito bom esse título agora", completou o hoje veterano jogador.

O primeiro pós-queda

Após a Copa João Havelange, o futebol brasileiro não teve mais nenhuma virada de mesa favorável aos grandes clubes do País, o que propiciou um número nunca antes visto de times tradicionais na Série B nacional.

Botafogo e Palmeiras (2003), Grêmio (2005), Atlético-MG (2006), Coritiba (2006, 2007 e 2010), Corinthians (2008) e Vasco (2009) participaram da segunda fivisão e, de todos esses, apenas o Coritiba levou mais de uma temporada para voltar à Série A.

Até aqui, no entanto, nenhum desses clubes conseguiu conquistar o título brasileiro após o retorno à primeira divisão na "Era dos Pontos Corridos" (a partir de 2003), algo que pode ocorrer agora caso o Fluminense ganhe o Campeonato Brasileiro deste ano.

Gazeta Esportiva Gazeta Esportiva
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