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Cinco desafios que aguardam os torcedores na Copa do Mundo

18 jul 2013 - 05h07
(atualizado às 14h28)
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O torcedor que deseja ver de perto algum dos 64 jogos da Copa do Mundo de 2014 no Brasil terá alguns desafios pela frente. Passando da compra do ingresso até a entrada no estádio, o público tradicional já acostumado a frequentar jogos no país precisará passar por adaptações para aproveitar a chance de ver o Mundial no ano que vem.

Nesta sexta-feira, a Fifa anuncia os detalhes sobre o valor e a distribuição das entradas. Sem bilheterias ou postos físicos de vendas, os ingressos só poderão ser comprados pela internet, no site da organização.

Com o ingresso garantido, o próximo passo do torcedor será planejar seu trajeto para chegar ao estádio no dia do jogo. Em todas as 12 cidades-sede da Copa, obras de mobilidade urbana foram incluídas nos projetos para o Mundial, mas ainda há dúvidas sobre se haverá tempo para concluir todas elas.

Das cidades que já passaram pelo "teste" da Copa das Confederações, algumas como Recife, Belo Horizonte e Fortaleza apresentaram problemas e foram alvos de críticas dos torcedores por conta da lotação dos transportes públicos e pela demora no acesso ao estádio.

Passados os dois primeiros desafios, já no entorno do local do jogo, o torcedor ainda pode enfrentar algumas dificuldades.

Caso novos protestos como os que ocorreram durante a Copa das Confederações se repitam no Mundial, quem quiser ir às partidas precisará driblar possíveis bloqueios e checagens de segurança para entrar no estádio.

Se o ambiente nos arredores do palco da partida estiver livre de protestos, o torcedor poderá aproveitar o tempo que resta antes do início do jogo para comer alguma coisa ou tomar um refrigerante.

Mas os tradicionais ambulantes que costumam preencher as ruas em dias de jogos não serão uma opção para o público da Copa. O espaço no entorno das arenas é reservado para produtos licenciados pela Fifa, o que também significa um custo maior para o torcedor.

Os próprios serviços oferecidos dentro do estádio ─ incluindo a venda de cerveja, algo proibido em competições nacionais ─ também são de responsabilidade da entidade, e os altos preços cobrados na Copa das Confederações também já foram alvo de críticas.

O último dos desafios para o torcedor tradicional que for a um jogo do Mundial será justamente se adaptar à maneira de assistir à partida: nada de acompanhar o jogo de pé, com o tradicional som das baterias nas arquibancadas e os bandeirões erguidos na torcida. Os brasileiros terão que adaptar seus costumes às normas da Fifa.

A entidade possui um código de conduta para o torcedor nas competições que organiza e, nele, alguns dos comportamentos típicos da torcida brasileira no estádio são proibidos.

Abaixo, a BBC Brasil detalha os cinco desafios que o torcedor terá de enfrentar para assistir à Copa sem decepções.

Ingressos

O preço alto e a logística da retirada das entradas são as duas principais dúvidas que podem se tornar obstáculos para o público que deseja ver um jogo da Copa ao vivo.

Os detalhes sobre a venda dos ingressos serão divulgados somente nesta sexta-feira. O anúncio estava previsto para 1º de julho, mas a Fifa precisou fazer alguns ajustes após a Copa das Confederações e optou por adiá-lo.

A expectativa é grande, já que o próprio secretário da entidade, Jérôme Valcke, afirmou que os ingressos do Mundial serão os mais baratos da história do torneio.

Na África do Sul, o valor mais baixo cobrado por uma entrada da Copa foi de US$ 20 (R$ 44) para jogos da primeira fase ─ exceção feita à partida de abertura.

Os ingressos mais baratos são reservados somente para cidadãos do país-sede. No Brasil, 300 mil ingressos deste tipo estarão disponíveis ─ cerca de 10% do total. Eles poderão sair ainda mais em conta para quem tem direito à meia-entrada (estudantes, idosos e beneficiários de programas sociais do governo federal).

Ainda assim, o ex-jogador, campeão mundial e atual colunista esportivo Tostão avalia que a cota de ingressos populares para a Copa não será suficiente para incluir o torcedor de mais baixa renda.

"Vai ser barato o preço de jogos de menor expressão", disse à BBC Brasil. "Isso é só para dar uma desculpa, falar que o ingresso não é caro, mas é muito pouco."

Já para Christopher Gaffney, vice-presidente da Associação Nacional dos Torcedores (ANT) e um dos fundadores da entidade em 2010, a Fifa deveria levar em consideração o salário mínimo do país-sede da competição na hora de determinar os preços para o Mundial.

"Eles dizem que serão os ingressos mais baratos", afirma. "Se for muito mais barato do que na Alemanha, por exemplo, ótimo, porque o salário mínimo no Brasil é muito mais baixo do que lá também."

O CEO do Comitê Organizador Local (COL) da Copa, Ricardo Trade, disse à BBC Brasil que tanto o comitê como o governo federal já estavam satisfeitos com os valores decididos antes mesmo da Copa das Confederações e não fizeram nenhum apelo para que a Fifa reduzisse mais as entradas.

"Nós não pedimos e o governo federal também não pediu à Fifa para baixar os preços dos ingressos porque estamos realizando um trabalho importante para o país que é a realização dessa Copa do Mundo aqui."

Trade afirmou que a única discussão recente que teve com a Fifa a respeito dos ingressos foi para construir uma estratégia melhor nos postos de troca ─ as longas filas para retirar as entradas foram uma das grandes reclamações dos torcedores na Copa das Confederações.

"A retirada dos ingressos nós podemos melhorar e vamos melhorar", disse o dirigente do COL. "Já conversei com eles para termos mais pontos de troca, e esses pontos vão ser decididos estrategicamente junto com as cidades."

Acesso ao estádio

Desde o deslocamento entre as cidades-sede pelos aeroportos até a ida às arenas pelo transporte público ou privado, o torcedor terá de estar preparado para enfrentar longas filas e outros transtornos ao longo do caminho.

As obras de infraestrutura nos aeroportos de algumas das cidades-sede têm previsão de entrega apenas para abril ou maio de 2014, a menos de um mês do início do torneio, e há riscos de que não fiquem prontas a tempo.

Para receber 1 milhão de torcedores brasileiros e outros 600 mil estrangeiros esperados pelo governo federal durante a Copa, os aeroportos estarão operando constantemente em sua capacidade máxima e, com isso, atrasos de voos e esgotamento de passagens podem se tornar problemas comuns durante o Mundial.

No caso do transporte até as arenas, as 12 cidades-sede também tinham projetos de melhorias para a mobilidade urbana que correm o risco de não serem entregues até o início do torneio. Durante a Copa das Confederações, algumas das cidades ─ principalmente Recife, Fortaleza e Belo Horizonte ─ já apresentaram problemas nesse quesito.

Um dos grandes responsáveis pela organização dos dois eventos, Ricardo Trade, CEO do Comitê Organizador Local (COL), disse à BBC Brasil que os problemas foram pontuais e reiterou que as obras de mobilidade são de responsabilidade das cidades, e não do comitê.

"Isso é de responsabilidade da cidade, nós apenas supervisionamos e, para o ano que vem, eles já estão se ajustando para receber melhor os passageiros."

"Sem a mobilidade urbana em algum momento você pode improvisar e fazer (ajustes)", afirmou. "Vamos realizar a Copa do Mundo, estando prontas as obras de mobilidade urbana ou não."

Trade diz ainda que grandes eventos como a Copa do Mundo sempre vão ter alguns problemas no transporte por conta do grande contingente de gente tentando se deslocar ao mesmo tempo. O dirigente do COL admite, no entanto, que novas estratégias estão sendo estudadas para amenizar possíveis transtornos.

"Em todo lugar, transportar 70 mil pessoas em um curto período de tempo é difícil. Estamos vendo uma maneira de prender mais o espectador pra que nem todo mundo saia assim que acabar o jogo."

Segurança

Bloqueios policiais e revistas rigorosas a uma distância de até 2 km das arenas devem ser práticas comuns nas cidades-sede do Mundial ─ e o rigor pode ser ainda maior se os protestos que se espalharam pelo país durante a Copa das Confederações se repetirem em 2014.

Nesse caso, o torcedor deve estar preparado para um ambiente tenso nos arredores do estádio. Confrontos entre policiais e manifestantes poderão ocorrer nas vias de acesso às arenas, com gás lacrimogêneo, bombas de efeito moral e até balas de borracha ─ armas não-letais das tropas de choque que podem acabar atingindo turistas.

Durante a Copa das Confederações, quando dezenas de milhares saíram às ruas, a polícia teve de lidar com situações como essas nas entradas dos jogos e foi acusada de cometer excessos na repressão aos manifestantes.

Na ocasião, a Fifa evitou comentar o assunto, mas o presidente da entidade, Joseph Blatter, afirmou nesta quarta-feira à agência de notícias alemã DPA que, se os protestos acontecerem novamente no Mundial, a Fifa terá de se questionar se acertou ao escolher o Brasil como país-sede. Blatter acrescentou ainda que a Copa do Mundo "não pode sofrer com distúrbios".

A possibilidade de as mesmas cenas se repetirem em 2014, no entanto, é minimizada pelo COL (Comitê Organizador Local). Ricardo Trade, dirigente do comitê, disse considerar até positiva a manifestação política dos brasileiros e negou que isso possa atrapalhar o torneio no ano que vem.

"Eu até me senti orgulhoso do país estar se movimentando, das pessoas poderem se manifestar nessa ambiência", afirmou à BBC Brasil.

"Mas o que está acontecendo fora é de responsabilidade das autoridades públicas. Nós só vamos tentar garantir que o torcedor que tenha passado por algum apuro do lado de fora, quando entrar no estádio possa sentir aquele ambiente de paz sensacional."

O vice-presidente da Associação Nacional dos Torcedores (ANT), Christopher Gaffney, cita, porém, o exemplo da final da Copa das Confederações, entre Brasil e Espanha, para ilustrar como possíveis confrontos entre manifestantes e policiais podem interferir no evento e até manchar a imagem do Brasil no exterior.

"A ação da polícia no Maracanã fez com que os jogadores sentissem o gás lacrimogêneo", diz Gaffney. "Foi a polícia então que passou a causar prejuízo para o evento, e não os manifestantes."

Comida e bebida

Pipoca, cachorro-quente e o típico churrasquinho brasileiro são alguns dos prazeres que o torcedor está acostumado a ter quando frequenta os jogos dos campeonatos nacionais.

Mas na Copa do Mundo esses hábitos alimentares devem mudar e vão exigir um investimento mais alto do público nas novas arenas.

Dentro e fora dos estádios, os ambulantes não poderão circular, e a comercialização de comidas e bebidas será feita apenas por empresas licenciadas pela Fifa.

O serviço, porém, já foi alvo de críticas durante a Copa das Confederações por conta das longas e demoradas filas nos bares e restaurantes dos estádios e também dos preços altos ─ um cachorro-quente custava R$ 8, enquanto o amendoim saía por R$ 7.

Mais do que isso, faltou também abastecimento nos restaurantes em alguns jogos. Ricardo Trade, CEO do Comitê Organizador Local, diz que o problema foi resultado da falta de tempo que a Fifa teve para testar o serviço.

"A entrega tardia dos estádios causou uma série de problemas para nós. Faltou realizar eventos-teste mais completos, não tínhamos todas as áreas prontas para testar em alguns estádios", afirmou Trade.

Do lado de fora, a tradicional cervejinha antes de entrar no jogo continua garantida, mas terá preço tabelado e marcas determinadas. Apenas marcas de uma das patrocinadoras oficiais da Fifa serão permitidas no raio de 2 km em torno do estádio.

Durante a Copa das Confederações, nos arredores das arenas, as latinhas de cerveja não foram vendidas a menos de R$ 5. Os ambulantes que costumam preencher as ruas em dias de jogos em São Paulo, em geral, cobram R$ 3 por uma latinha e R$ 5 por duas.

A venda de cerveja dentro dos estádios, proibida em jogos de campeonatos nacionais no Brasil, é uma exceção aberta à Fifa. Na Copa das Confederações, nos bares das arenas, o preço mínimo do copo de cerveja foi de R$ 9.

Na opinião de Christopher Gaffney, vice-presidente da Associação Nacional dos Torcedores, os altos preços de todos esses serviços acaba tornando o custo de um jogo da Copa do Mundo inviável para a maioria dos torcedores brasileiros.

"Não é só o valor do ingresso. Se você quiser comer, você vai pagar quase R$ 10 por um cachorro quente, se quiser beber uma água, terá que pagar mais R$ 6", afirma. "O ingresso é apenas o preço mínimo para entrar na zona de consumo."

Costumes

Acostumados a assistir aos jogos em estádios desconfortáveis, sem lugares previamente determinados e com sol e chuva na cabeça, os torcedores brasileiros viverão na Copa do Mundo uma experiência próxima à europeia.

As novas e modernas arenas inauguradas para o Mundial atendem ao chamado "padrão Fifa" e oferecem conforto, cadeiras numeradas e uma cobertura quase total dos assentos.

Mas durante a Copa os torcedores brasileiros terão que adaptar algumas atitudes costumeiras praticadas nos estádios em competições nacionais.

Se em uma partida de Campeonato Brasileiro, por exemplo, o torcedor entra pelo setor do ingresso comprado e escolhe onde vai ficar na arquibancada, na Copa do Mundo essa escolha já estará determinada na compra da entrada para o jogo e deverá ser respeitada à risca ─ os voluntários e a própria segurança do estádio são encarregados da fiscalização.

Assistir aos jogos de pé também não é uma opção para o torcedor brasileiro, que está acostumado a se sentar apenas no intervalo ou em momentos tediosos da partida. Essa é apenas uma das determinações que aparecem no Código de Conduta do torcedor criado pela Fifa para as competições que organiza.

As tradicionais baterias que embalam os cantos da torcida em jogos nacionais não serão permitidas, assim como quaisquer outros instrumentos "ruidosos" ─ incluindo as caxirolas, um tipo de chocalho criado pelo músico Carlinhos Brown especialmente para a Copa de 2014, em uma tentativa de repetir o frisson causado pelas vuvuzelas na África do Sul.

Para o vice-presidente da Associação Nacional dos Torcedores (ANT), Christopher Gaffney, as regras da Fifa sobre o comportamento da torcida nos estádios vão acabar "minando a cultura brasileira do futebol".

"Na Copa das Confederações, os jogadores do Brasil entravam no estádio com instrumentos musicais e tocavam antes e depois do jogo, mas o torcedor não podia fazer isso. É a inversão de papéis", afirmou à BBC Brasil.

"Antes, o torcedor brasileiro era um agente de produção do espetáculo, agora ele vai ser apenas um consumidor."

Já Ricardo Trade, CEO do Comitê Organizador Local (COL) da Copa, vê como positivas tanto a modernização dos estádios como a mudança de cultura no futebol brasileiro.

"Na hora que você entra no estádio, e eu tenho muito orgulho de dizer isso, é impressionante, é como se estivesse na Europa", diz Trade. "O futebol é uma indústria que movimenta muito dinheiro, e essa mudança da própria cultura do futebol é muito importante."

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