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Terra na Copa

Às vésperas da Copa do Mundo, prostituição infantil é preocupação em sedes

3 dez 2013 - 13h45
(atualizado às 14h35)
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<p>Vanessa, 13 anos, foi apanhanda pelos policiais e levada a um abrigo em Fortaleza; capital cearense é epicentro do turismo sexual, uma das principais preocupações para a Copa do Mundo de 2014</p>
Vanessa, 13 anos, foi apanhanda pelos policiais e levada a um abrigo em Fortaleza; capital cearense é epicentro do turismo sexual, uma das principais preocupações para a Copa do Mundo de 2014
Foto: Reuters

Com o Brasil às vésperas de sediar a Copa do Mundo do ano que vem, autoridades temem pela explosão da prostituição infantil. A indústria do sexo tende a migrar para as grandes cidades em eventos de grande repercussão, ao passo que profissionais tendem a recrutar prostitutas menores de idade para atender à demanda local e de torcedores estrangeiros.

"Estamos preocupados com o aumento da exploração sexual em cidades-sede (da Copa do Mundo) e em torno delas", disse Joseleno Vieira dos Santos, que coordena um programa nacional de combate à exploração sexual de crianças na Secretaria Nacional de Direitos Humanos. "Estamos tentando coordenar esforços o máximo possível com os governos municipais e estaduais para entender a origem do problema."

A prostituição infantil é dirigida majoritariamente à demanda local no Brasil: mais de 75% dos clientes vêm do mesmo estado das vítimas (ou de estados próximos), segundo estimativas da secretaria. O turismo sexual envolvendo crianças é ativo em metrópoles litorâneas e aumenta em eventos maiores, como Carnaval e Reveillón.

Não será diferente na Copa do Mundo. As autoridades enfrentam um grande desafio diante de trabalhadores da indústria do sexo de todas as idades - além de pessoas que as controlam. A Associação das Prostitutas de Minas Gerais (Apromig), uma organização que representa os trabalhadores do sexo no estado, está até mesmo oferecendo aulas grátis de inglês para as prostitutas de Belo Horizonte, sede da Copa do Mundo de 2014.

"Haverá certamente muito mais gente circulando nesta área durante as partidas e a cidade estará cheia de turistas", disse Giovana, uma travesti de 19 anos, trabalhando em uma esquina próxima ao Estádio do Castelão, em Fortaleza. "Sei que haverá mais trabalho para todo mundo - mulheres, meninas, todo mundo."

A Embratur espera que a Copa do Mundo atraia 600 mil visitantes estrangeiros para o Brasil, que gastariam R$ 25 bilhões em viagens pelo País. O torneio como um todo poderia injetar R$ 113 bilhões na economia brasileira em 2014, disse a Fifa, citando um relatório da consultoria Ernst & Young. Por sua vez, o governo irá gastar R$ 33 bilhões em estádios, transporte e outras infraestruturas até o início do torneio, além de R$ 10 milhões em propaganda.

Na contramão, muito pouco tem sido gasto no combate à exploração sexual de menores, afirmam partidários da causa. Ainda que o governo alegue trabalhar na questão há uma década, o número de trabalhadores infantis na indústria do sexo estacionou em 500 mil em 2012, de acordo com o Fórum Nacional de Prevenção e Erradicação do Trabalho Infantil, uma rede de organizações não-governamentais. O número aponta um crescimento desde 2001, quando 100 mil crianças trabalhavam na indústria do sexo, de acordo com iniciativas da Unicef.

A Secretaria de Direitos Humanos designou R$ 8 milhões para que as cidades-sede da Copa do Mundo desenvolvam projetos de combate à prostituição infantil, embora Joseleno Vieira alegue que nem todas as cidades tenham programas para tais fundos. O departamento de Santos está perto de concluir uma revisão da prostituição infantil em locais importantes, para então decidir as ações que serão tomadas.

No entanto, os programas irão apenas arranhar a superfície. "Nós percebemos que estamos apenas tocando a ponta do iceberg com essas ações para a Copa do Mundo, mas esperamos sermos capazes de capacitar e implantar programas de longo prazo no futuro", disse Joseleno.

Além da Secretaria dos Direitos Humanos, o governo não conseguiu fornecer dados do total gasto para enfrentar a prostituição infantil. Porém, defensores dizem que os programas foram fechados e alegam que o governo não tem feito o suficiente para solucionar o problema.

"Este assunto não faz parte da agenda do governo, e não vemos boa vontade para combinar esforços ou aumentar esforços para solucionar o problema da exploração infantil de menores", afirma Denise Cesario, diretora da Fundação Abrinq, parceira local da Save The Children internacional.

A tentação de Fortaleza

O turismo sexual acontece por todo o Brasil, mas Fortaleza - um destino turístico de destaque, com praias de areia branca e 300 dias por ano de sol - é um dos epicentros do turismo. Uma cultura de machismo, combinada com extrema pobreza e uso de drogas, criou um ambiente perfeito para a exploração sexual. É o que afirma trabalhadora como Cecília dos Santos Góis, que trabalha na Cedeca, uma organização em defesa dos direitos das crianças.

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Nos arredores pobres e áridos de Fortaleza, é culturalmente aceitável que pais vendam filhas para o comércio do sexo como uma fonte de renda, diz Góis. Há mais ligações oriundas de Fortaleza para um número gratuito nacional para relatar exploração sexual do que de qualquer outra cidade do Brasil em uma comparação per capita, dizem especialistas.

Enquanto o turismo sexual internacional é proeminente em Fortaleza, ele representa apenas um terço de todos os casos relatados de prostituição infantil. Prostitutas com clientes brasileiros, do Ceará e de estados vizinhos, são mais comuns, dizem promotores.

Muitos dos jovens trabalhadores do sexo de Fortaleza veem a prostituição como uma maneira de escapar de tais circunstâncias. Jessica, 16 anos, morena alta com sobrancelhas finais e esmalte azul-bebê, começou a trabalhar com clientes locais, ganhando cerca de R$ 40 por noite, antes de chegar a boates maiores e a grupos de turistas estrangeiros por cerca de R$ 200 por noite.

Policiais prenderam Jessica no ultimo mês de setembro na praia de Iracema, centro da indústria do sexo. As forças de segurança a levaram para um dos quatro abrigos para prostitutas menores de idade, uma discreta casa de dois pavimentos, acessível apenas por um estreito portão de ferro observado por seguranças.

Sentada em um pequeno quarto que ela divide com outras três garotas mais jovens, Jessica diz que um de seus clientes regulares – um espanhol – prometeu levá-la à Europa. "Eu disse a ele que tinha 18 e estava tirando meu passaporte", contou, usando um top multicolorido e calças em verde e amarelo. "Paguei R$ 500 por uma identidade falsa e estava juntando dinheiro para comprar um passaporte falto. Mas, no fim, fiquei com medo de ir."

Cafetões e clientes raramente são punidos, e quando os promotores conseguem conduzir uma denúncia, as vítimas frequentemente mudam depoimentos, e os casos são descartados. É o que diz Francisco Carlos Pereira de Andrade, um promotor especializado na exploração infantil. De 2 mil casos no departamento, que avalia apenas casos de violência sexual contra crianças, apenas cerca de 20 envolviam a prostituição infantil.

A face do turismo sexual em Fortaleza está também mudando, segundo Andrade, tornando mais difícil capturar criminosos. Ao invés de trabalhar nas ruas, círculos organizados de cafetões, gerentes de hotéis e taxistas recrutam meninas. Clientes estrangeiros "encomendam" prostitutas menores de idade, e elas são entregues diretamente nos hotéis, afirma o promotor.

Vanessa tinha 13 anos quando foi pega pelos policiais em outubro, próxima do estádio de Fortaleza, e foi levada ao mesmo abrigo de Jessica. Ela diz que deixou a casa em um bairro pobre quando tinha 10 anos, depois que começou a ser agredida pelo padrasto. A garota afirma ter vivido principalmente nas ruas, indo a abrigos e agora passando noites com clientes - alguns dos quais ela chama de amigos.

Em 2 de novembro, Vanessa invadiu a sala de manutenção do abrigo e escalou uma parede de 2,5 m que circulava o prédio, disse Leonora Albuquerque, uma das coordenadoras do local. Ela foi convencida por duas outras garotas, de 12 e 13, a voltar para as proximidades do estádio. Era a quarta vez que ela escapava em seis meses.

"É muito difícil convencer essas garotas a viver vidas comuns”, disse Albuquerque. “Muitas delas acham que abuso (sexual) e o comércio de seus corpos é um fato da vida”, completou.

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