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Terra na Copa

Para especialista, localização da Arena Pernambuco foi um erro

29 jun 2013 - 07h28
(atualizado às 07h28)
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Itaipava Arena Pernambuco já receberá dois jogos da Série A na próxima semana: Náutico x Ponte e Botafogo x Fluminense
Itaipava Arena Pernambuco já receberá dois jogos da Série A na próxima semana: Náutico x Ponte e Botafogo x Fluminense
Foto: Eduardo Amorim / Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra

Após a vitória da Espanha por 2 a 1 sobre o Uruguai, o secretário extraordinário da Copa de Pernambuco, Ricardo Leitão, deu nota oito aos serviços públicos e ao funcionamento da Arena Pernambuco na Copa das Confederações, e acabou sendo muito criticado pela imprensa e via redes sociais. Na coletiva após os três jogos realizados no estado, ele evitou dar uma nova nota, mas sugeriu que quem acompanhou todo o processo fizesse sua avaliação. A reportagem do Terra decidiu, então, fazer uma entrevista com um dos maiores especialistas em transportes do Nordeste.

Confira todos os vídeos da Copa das Confederações

O engenheiro Oswaldo Lima Neto é professor-doutor da UFPE na área de transporte e foi, até dezembro de 2012, secretário de Serviços Públicos de Olinda. Por duas vezes foi presidente da EMTU (hoje Grande Recife Consórcio de Transporte) durante o governo de Miguel Arraes e chegou a ser também vice-presidente da Empresa Brasileira de Planejamento de Transporte. Atualmente, ocupa o cargo de secretário de Trânsito e Transportes de Olinda.

Veja trajeto de metrô para chegar na Arena Pernambuco:

Na entrevista à seguir, Oswaldo Lima Neto critica a escolha por construir um estádio em São Lourenço da Mata e sugere melhorias para que não se repitam no ano que vem os mesmos transtornos aos torcedores que aconteceram especialmente na partida entre Espanha e Uruguai.

Confira a entrevista na íntegra

Terra - O secretário das Cidades do Estado, Danilo Cabral, afirmou em recente entrevista coletiva que o Governo do Estado tinha 11 opções de locais para construção da Arena Pernambuco. Diante dos muitos problemas enfrentados pela população para chegar e sair do estádio durante os jogos da Copa das Confederações, seria possível dizer que houve erro na escolha do local da sede pernambucana da Copa do Mundo 2014?

Oswaldo Lima Neto -  Infelizmente nossa região metropolitana não dispõe de um Plano de Desenvolvimento Urbano que forneça um modelo de crescimento e que estabeleça onde e como localizar as atividades que vão gerar os fluxos. Há um entendimento mundial no urbanismo contra o espalhamento urbano, pois ele encarece, dificulta e muitas vezes inviabilizam o fornecimento das redes de infraestrutura, especialmente de transporte público, que só tem condição de bom funcionamento em locais densos. Pela falta desse modelo que indicasse a melhor localização, o Governo decidiu sua localização em São Lourenço no bojo de uma ideia de puxar o desenvolvimento urbano para o Oeste, esta decisão irá induzir um espalhamento urbano indesejado. Tomemos o exemplo de duas cidades uma a cidade de Atlanta, nos Estados Unidos, moldada pelo modelo de priorização total do automóvel com 2,5 milhões de habitantes ocupando uma área de 4.288 km² e Barcelona, na Espanha, com 2,8 milhões de habitantes ocupando uma área 160 km². Ou seja: Atlanta é 27 vezes maior em área que Barcelona. Barcelona é uma cidade com uma ótima rede de transporte público e uma vida cultural invejável; o mesmo não podemos falar de Atlanta.

Oswaldo Lima é secretário de Olinda e defendeu instalação de estádio no Município, que acabou sendo preterido pelo projeto construído em São Lourenço da Mata
Oswaldo Lima é secretário de Olinda e defendeu instalação de estádio no Município, que acabou sendo preterido pelo projeto construído em São Lourenço da Mata
Foto: Passarinho/Prefeitura de Olinda / Divulgação

Terra - O Governo do Estado enfrenta algumas dificuldades para efetuar as remoções da população que mora na área em que será construído o terminal integrado de passageiros de Cosme e Damião e o Ramal da Copa, que será a via alternativa de chegada ao estádio. As duas obras são imprescindíveis para a melhoria do acesso ao estádio?

Oswaldo -

 Claro que as obras de transporte público são imprescindíveis para o funcionamento do estádio. A não ser que o Governo Federal continue e aprofunde sua política de incentivo a aquisição de automóvel e, além da retirada dos impostos, comece a subsidiar o preço dos veículos, teremos uma população motorizada que dispensará o transporte público, porém não sei se conseguirá acessar o estádio devido aos congestionamentos. Porém, ainda ficam por resolver os idosos e os jovens que não dirigem, sem falar das pessoas portadoras de deficiência, que sequer são consideradas.

Terra - Enquanto secretário do município de Olinda, o senhor chegou a defender publicamente a opção pela construção do estádio na região do Complexo de Salgadinho (entre Recife e Olinda). Ainda acredita que teria sido a melhor localização? A obra poderia ter sido realizada em Olinda a tempo dos jogos da Copa das Confederações?

Oswaldo -

 A resposta sobre a localização foi dada acima, é obvio que obras em lugares densos têm de enfrentar problemas de desapropriação o que pode vir a exigir mais tempo, porém pela existência das redes de infraestrutura podem compensar o tempo e os recursos gastos para supri-las onde não existe nada.

Terra - O projeto de Olinda estava intimamente ligado a mudanças no tráfego da Agamenon Magalhães. Depois dos muitos estudos realizados, o senhor acredita que a melhor proposta para a avenida que liga a Zona Sul do Recife à cidade de Olinda seja o Veículo Leve sobre Trilhos sobre o canal, ideia apresentada pelo arquiteto Jaime Lernner de uma via para ônibus elevada por ali ou os viadutos cruzando a via? Proposta que havia vencido o debate e recentemente deixou de ser vista como prioridade para a Copa do Mundo.

Oswaldo -

 Os Planos Diretores de Transporte Urbano da RMR têm reafirmado sistematicamente a importância do eixo Norte- Sul de nossa RMR como o principal e mais importante eixo de deslocamento da região. É óbvio que se necessita contemplar este eixo com transporte de massa. Jaime Lerner apresentou um esboço de projeto sobre a Avenida Agamenon Magalhães, porém não considerou os demais aspectos que envolvem uma obra deste porte - por exemplo, o tipo de solo ao longo do canal, o custo desta alternativa. A escolha de uma modalidade de transporte tem de olhar para dois aspectos: o fluxo presente e futuro que deseja atender e seu custo. Na projeção do PDTU/RMR, o corredor Norte-Sul em 20 anos terá uma demanda de até 20 mil passageiros por hora, esta demanda pode ser atendida por um BRT (Sistema de Transporte Rápido por ônibus, no original em inglês Bus Rapid Transit), que pode atender demandas de até 30 mil passageiros por hora a um custo de US$ 8 a 10 milhões/km. Se optar por um VLT com demanda equivalente, o custo sobe para US$25 milhões por quilômetro. E se falarmos de metrô verdadeiro, que transporta mais de 65 mil passageiros por hora, estamos nos referindo a custos de cerca de US150 mihões/km. E mais: o que se necessita não é de uma linha e sim de uma rede. Logo, temos de optar pela modalidade melhor do ponto de vista do custo efetividade: o BRT.

Recife comemora resultados na Copa das Confederações:
Terra - Chegou a tomar conhecimento de outros projetos de estádio que tivessem localização privilegiada? O prefeito Elias Gomes, por exemplo, levou proposta para construção ao lado de uma das maiores estações de integração metrô/ônibus de Jaboatão dos Guararapes.

Oswaldo - Na época da tomada esta opção não foi considerada.

Terra - A Arena Pernambuco fica a 2,3 km metros da Estação de Metrô de Cosme e Damião. É possível tornar a chegada e saída do estádio uma prática simples? Havia ônibus gratuitos durante os jogos da Copa das Confederações e, mesmo assim, houve muitos transtornos aos pagantes neste percurso, especialmente na partida do dia 16 (Espanha x Uruguai). Além disso, os ônibus não devem continuar sendo financiados para uma partida do Náutico ou de outro time que venha a fechar contrato com a Sociedade de Propósito Específico Arena Pernambuco.

Oswaldo -

Obviamente, tem de se manter um esquema de acesso por transporte público à Arena. Os transtornos aconteceram pela imposição da FIFA de isolar uma área de 2 km de raio da arena. Todos sabemos que uma distância aceitável de caminhada a uma parada de transporte público é de 500 m: estamos falando de quatro vezes mais, e o pior é que impuseram o metrô como única alternativa de acesso. O nosso metrô na hora de pico tem a capacidade máxima de 15 mil passageiros por hora (em cada sentido) em intervalos de 4 minutos. Se tudo ocorrer às mil maravilhas, ora imagine dos 42 mil espectadores se 30 mil tivessem de ser escoados pelo metrô, isto levaria mais de 2 horas - insisto, se tudo corresse às mil maravilhas. Vimos que muitas pessoas levaram muito mais do que isto. Teria sido muito mais racional se esta demanda tivesse sido distribuída por linhas de ônibus nos diferentes estacionamentos dos shoppings da cidade se dirigindo diretamente à arena, sem ser obrigado a ir ao metrô, porém isto a Fifa não permitiu. O fato de o estádio não ficar próximo da estação do metrô é um problema que foi incorporado definitivamente à arena. Por exemplo, muitos estádios estão ligados diretamente a estações do metrô, por exemplo, o estádio de Amsterdam, justamente para evitar este problema. Não sobra alternativa do que montar um sistema de linhas de alimentação com capacidade suficiente para atender à demanda. Por ser uma demanda de pico, é uma solução cara.

Secretário Ricardo Leitão e superintende interino da CBTU, José Renato, participaram de coletiva para avaliação dos serviços públicos do Estado durante a Copa das Confederações
Secretário Ricardo Leitão e superintende interino da CBTU, José Renato, participaram de coletiva para avaliação dos serviços públicos do Estado durante a Copa das Confederações
Foto: Eduardo Amorim / Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra
Terra - Como evitar transtornos especialmente aos moradores da Zona Sul nas partidas que forem disputadas, por exemplo, no horário das 19h, quando o trânsito na Avenida Recife e BR-101 é intenso?

Oswaldo -

 Aqui não há saída: ou se busca forma de priorizar o transporte público na circulação e incentivar seu uso ou o congestionamento é um obstáculo previsível.

Terra - A Secretaria Extraordinária da Copa adquiriu um bicicletário com quase 200 vagas e instalou 100 na área da Arena Pernambuco. Seria a bicicleta mais uma alternativa para diversificar os modais em que os torcedores chegam ao estádio, que fica a cerca de 20 km do Centro do Recife? Ou pelo menos para as populações de Cosme e Damião, Camaragibe e São Lourenço...

Oswaldo:

Sem dúvida, com a utilização crescente da bicicleta, o acesso através delas também tem de ser contemplado, ou seja, os bicicletários devem ser em lugar seguro e próximo ao destino, porém estas condições, também não são aceitas pela Fifa.

Terra - Qual o principal legado que deve ficar para o trânsito e o transporte da Região Metropolitana do Recife após a Copa do Mundo?

Oswaldo -

 Espero que pelo menos os corredores Norte-Sul e Leste-Oeste fiquem como legado.

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Fonte: Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra Brisa Comunicação e Arte - Especial para o Terra
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