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Copa do Mundo

1998: a "convulsão" do Brasil na visão de um predestinado

26 mai 2010 - 06h53
(atualizado às 07h03)
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Gustavo Antonio

Ao entrar no gramado do Estádio Velódrome em 7 de julho de 1998, Zé Carlos se deparou com uma situação bem diferente da que vivia um ano antes. Em 1997, o lateral direito defendia a Matonense na Série B do Campeonato Paulista, ajudando a equipe do interior a subir para a elite do futebol estadual. Passada uma temporada, o jogador, então com 30 anos, substituía o suspenso Cafu na semifinal da Copa do Mundo da França, tendo astros como Ronaldo e Rivaldo no seu time, além de enfrentar adversários como Edgar Davids e Denis Bergkamp, dois dos principais nomes da Holanda.

Sem ritmo de jogo, Zé Carlos não teve uma grande atuação contra a Holanda - sofreu principalmente com as descidas de Zenden e Bergkamp pela esquerda do ataque holandês -, mas mesmo assim pôde comemorar a classificação brasileira para a final, conquistada apenas na disputa de pênaltis depois de um empate por 1 a 1 no tempo normal e na prorrogação.

Atualmente com 41 anos, o ex-jogador lembra com orgulho da mudança repentina de sua vida entre 1997 e 1998, mas lamenta ter perdido aquele Mundial para a França, na final que ficou marcada pela convulsão sofrida por Ronaldo antes da partida. O problema do atacante acabou se "alastrando" pelo resto do time brasileiro, que, atordoado, não se encontrou em campo.

"Contra a Holanda, não atuei tão bem, mas consegui suportar a pressão e vencemos. Para mim, o jogo mais marcante daquela Copa foi a final, porque a França não era um dos times mais perigosos e poderíamos ter vencido", lembra Zé Carlos, que contou com a sorte para chegar até o Mundial.

Depois da campanha vitoriosa realizada pela Matonense na Série B do Campeonato Paulista, Zé Carlos foi para o São Paulo e conquistou o título estadual de 1998. Apesar das boas atuações, o lateral direito afirma que não tinha muitas esperanças de ser convocado.

"Nos bastidores já rolava que o Flávio Conceição seria convocado para a reserva do Cafu por jogar tanto no meio-campo quanto na lateral. Sempre fui humilde e encarei a situação com normalidade. Mas o Flávio se machucou e foi cortado. Ele até chegou a melhorar e avisou a CBF, mas mesmo assim ele ficou fora e eu fui convocado", explica o ex-jogador, que lembra-se até hoje do momento em que foi informado que iria disputar a Copa.

"Foi uma sensação indescritível. Faltando dois dias para as férias, eu estava no treino recreativo do São Paulo quando o Serginho (lateral esquerdo) chegou e falou que tinha um boato de que eu iria ser convocado para a Copa. Cinco minutos depois, vi vários jornalistas atravessando o campo para me cumprimentar. Eu comecei a vibrar e até me tiraram do treino para evitar o risco de uma lesão", conta.

Conhecido por seu bom humor, Zé Carlos lembra que não realizava muito sua famosa imitação de um galo na concentração da Seleção Brasileira por ter pouca intimidade com os jogadores. Mas afirma que não se intimidou diante da presença de atletas consagrados como Ronaldo, Roberto Carlos e Rivaldo.

"Não conhecia ninguém e ficava mais retraído. Mas vinha fazendo uma boa temporada e sabia que tinha potencial para defender a Seleção Brasileira. Sempre fui uma pessoa simples, mas tenho personalidade", aponta Zé Carlos.

A grande chance contra a Holanda e decepção na final

Do banco de reservas, Zé Carlos viu o Brasil vencer Escócia e Marrocos e perder para a Noruega na primeira fase. Na etapa de "mata-mata", os comandados de Zagallo passaram por Chile e Dinamarca, sendo que, nesta última partida, Cafu levou o cartão amarelo que o deixaria fora da semifinal. Era a grande chance de Zé Carlos.

"Todo jogador que está na Seleção espera um momento como esse. Foi uma surpresa, mas sabia que iria enfrentar dificuldades, principalmente por não jogar há muito tempo. Eu havia disputado a final do Paulista em maio e aquele jogo contra a Holanda foi em julho. Senti falta do tempo de bola, mas as pessoas não sabem disso. Não analisam direito e preferem criticar", defende-se Zé Carlos, que viu Taffarel defender as penalidades de Cocu e Ronald de Boer, classificando o Brasil para a final contra a França.

Poucas horas antes da decisão, porém, Ronaldo, eleito o melhor do mundo pela Fifa em 1996 e 1997, sofreu uma convulsão que abalou o time brasileiro. Zé Carlos estava no quarto ao lado e foi um dos primeiros a ver o camisa 9 passando mal.

"Eu estava no quarto ao lado com o César Sampaio e entramos praticamente juntos no quarto do Ronaldo, que estava deitado. Em seguida, chegaram o médico e os outros jogadores meio apavorados. Depois levaram o Ronaldo para o hospital e ele chegou ao estádio dizendo que estava bem e que queria jogar", lembra Zé Carlos, que não admite que a convulsão do camisa 9 tenha sido o principal fator para a derrota brasileira.

"Tivemos o problema do Ronaldo, mas, no meu entender, não justifica a derrota. Às vezes, o jogador passa por problemas particulares, mas, quando entra em campo, deixa tudo de lado. Não perdemos por causa do Ronaldo. Perdemos porque o Brasil não se encontrou e porque jogamos um futebol medíocre", diz o ex-lateral, que, do banco de reservas, sofreu com a grande atuação de Zinedine Zidane, autor de dois dos três gols da vitória francesa por 3 a 0 (Petit fez o terceiro tento).

Apesar da decepção da derrota, Zé Carlos, que hoje dá aulas de futebol em um projeto social em Osasco, avalia como satisfatória sua experiência na Copa do Mundo de 1998. "Tenho muito mais coisas positivas para lembrar. Muita gente critica, mas tenho uma história muito bonita: vim de uma origem humilde, mas consegui chegar a uma Copa do Mundo e alcançar meus objetivos. Temos que saber relevar as críticas e o importante é guardar os momentos de alegria", diz o ex-jogador.

Após sofrer uma convulsão, Ronaldo teve uma atuação apática na final contra a França e viu o Brasil perder por 3 a 0
Após sofrer uma convulsão, Ronaldo teve uma atuação apática na final contra a França e viu o Brasil perder por 3 a 0
Foto: Getty Images
Fonte: Especial para Terra
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