"Abandonados", clubes do interior de SP sofrem para se reerguer
Problemas financeiros, falta de apoio e calendário são apontados como culpados pela crise
O Campeonato Paulista ganhou fama de ser o estadual mais equilibrado do Brasil porque, além de São Paulo, Corinthians, Santos e Palmeiras, algum clube do interior aparecia para brigar pelo título – Inter de Limeira e Bragantino foram inclusive campeões em 1986 e 1990, respectivamente. Hoje em dia, porém, o que se vê é uma hegemonia dos quatro grandes e raríssimas surpresas. A falta de apoio da Federação Paulista de Futebol (FPF) e de um calendário durante o ano todo, além dos problemas financeiros, são os principais responsáveis para esse abismo entre os times aumentar a cada ano que passa.
Para efeito de comparação, as cotas de televisão para o Campeonato Paulista de 2013 foram dividas da seguinte forma: Corinthians, Palmeiras, Santos e São Paulo receberam R$ 10,815 milhões, enquanto as outras 16 equipes da elite ficaram com apenas R$ 2,115 milhões. A diferença é ainda maior em relação às divisões inferiores. Os integrantes da Série A2 receberam R$ 112 mil e da Série A3 ficaram com R$ 60 mil.
E é justamente essa diferença gritante nos valores recebidos que o futebol no interior de São Paulo está em decadência. Apesar do "abandono", a maioria dos clubes do interior evita entrar em conflito com o presidente Marco Polo Del Nero e os outros dirigentes da FPF. São poucos que têm a coragem de criticar a entidade - e quando o fazem, pegam leve.
"A FPF teria que sofrer uma reforma para dar mais atenção aos clubes do interior, procurar outros mecanismos para tornar o futebol mais atrativo. Tem a Copa Paulista nesse segundo semestre, mas é um campeonato que não desperta o interesse de ninguém, de empresários, torcedores...", afirmou o presidente da Inter de Limeira, Taymon Bueno. Campeão paulista em 1986, o time está atualmente na Série A3 e no último dia 5 completou 100 anos de história.
Dono de uma das torcidas mais fanáticas do interior, o XV de Piracicaba voltou em 2011 à elite do Campeonato Paulista e aos poucos vem tentando se reerguer para incomodar novamente os grandes, assim como aconteceu em 1976, quando enfrentou o Palmeiras na final e ficou com o vice-campeonato.
"A nossa maior dificuldade hoje é ter um calendário durante todo o ano. Isso acaba nos prejudicando bastante. O ideal será uma melhor valorização do campeonato regional e uma ferramenta que facilite nossa presença no campeonato nacional. Só tendo um calendário durante todo o ano é que vamos conseguir nos reerguer", explicou o presidente Celso Christofoletti.
Um dos principais ídolos da torcida xvzista, Cléber Gaúcho fez parte do elenco campeão da Série C do Campeonato Brasileiro em 1995 e hoje é o treinador do clube na Copa Paulista. Seguindo a mesma linha do presidente, ele reforça a ideia de que a falta de um calendário no segundo semestre prejudica o desenvolvimento do time e defende a manutenção dos estaduais. Hoje em dia, muitos querem ver o Brasil se adaptar ao calendário europeu, pedindo o fim dos campeonatos regionais.
"Muitas pessoas querem o fim dos estaduais, mas não acredito que a saída seja essa. Precisa achar uma fórmula para que o campeonato fique atrativo para os clubes grandes e do interior. O desafio é achar um meio termo. Se você acabar com os estaduais, estará eliminando uma grande porcentagem de clubes do país. E outra: os estaduais são charmosos e não imagino o futebol brasileiro sem eles", defendeu Cléber Gaúcho.
E o que acontece dentro de campo acaba refletindo nas arquibancadas. Atualmente, os estádios do interior ficam cheios apenas quando São Paulo, Corinthians, Palmeiras e Santos estão em campo, pois as pessoas querem ver seus ídolos mais de perto. A “concorrência” com os grandes incomoda os dirigentes, mas não existe fórmula mágica para reconquistar os carinhos dos torcedores. O vice-presidente do Rio de Branco de Americana, Téo Feola, sabe que isso só vai acontecer quando o time voltar para a elite – atualmente está na Série A2 – e ter outros objetivos que não sejam lutar contra o rebaixamento.
“Todo mundo já nasce com um time grande do coração. O que cabe a nós do interior é apresentar um bom futebol dentro de campo, porque isso vai atrair novamente o torcedor ao estádio. Nosso objetivo é subir para a Série A1 no ano que vem, porque assim com certeza a torcida vai voltar a apoiar o clube de sua cidade”, argumentou o dirigente.
A última vez que São Paulo, Palmeiras, Corinthians e Santos não conquistaram o Campeonato Paulista foi em 2004, quando o São Caetano venceu o Paulista de Jundiaí na final. Depois disso, Ponte Preta (2008), Santo André (2010), Guarani (2012) e o próprio São Caetano (2007) chegaram até a decisão, mas perderam para Palmeiras e Santos.
Através da assessoria de imprensa, a Federação disse não ter nenhuma informação sobre qualquer reclamação dos clubes em relação ao abismo de diferença na divisão dos direitos televisivos. Mas, caso haja, o presidente Marco Polo Del Nero está sempre aberto a ouvir os filiados, acrescenta a entidade.