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Ex-sereia e miss, musa larga futebol e recomeça vida no PR

Jogadora se destacou como Sereia da Vila, time feminino do Santos que deixou de existir em 2012; mas abandonou a carreira diante das dificuldades de sobrevivência na modalidade no País

1 out 2014 - 11h10
(atualizado às 11h12)
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"Acabaram com os nossos sonhos". A frase mais repetida durante a entrevista exclusiva ao Terra da musa do futebol feminino, a atacante Dani Pato, resume aquilo que jamais entendeu: o abrupto término do time mais vencedor da história da modalidade no País.

Dani soube do fim pela televisão, de férias, quando se surpreendeu ao ver a colega Érika chorando em entrevista convocada em 3 de janeiro de 2012, na Vila Belmiro, para anunciar o encerramento do projeto Sereias da Vila pelo Santos. A partir dali, perdeu tudo. As colegas de time, a moradia provisória (alojamento), uma bolsa prometida na faculdade, os planos de fixar a família em Santos e crescer trabalhando paralelamente como modelo e, por fim, a vontade de seguir com o futebol.

<p>Dani&nbsp;Pato tentou BBB, mas sem sucesso&nbsp;</p>
Dani Pato tentou BBB, mas sem sucesso 
Foto: Arquivo pessoal do Facebook

Quase três anos depois do anúncio feito pelo então presidente Luis Álvaro Ribeiro, sob alegação de dificuldades de patrocínios devido a "falta de exposição da marca" e o aumento de custos para a manutenção de Neymar, a musa optou há nove meses por jogar a tolha. Voltou a Dois Vizinhos-PR, cidade de pouco mais de 30 mil habitantes, para trabalhar no atacado de doces com o pai e conseguir concluir o novo desafio: pagar a faculdade de fisioterapia.

"Em dezembro (de 2011) entrei de férias, esperando uma ligação, como sempre, para saber o dia que deveria me apresentar. Daí, liguei a televisão em casa e vi a Érika na Band chorando. Soube por ali que tinham acabado com o time do Falcão (de futsal) e o nosso. Acabaram com nossos sonhos. Muitas meninas tinham bolsas (de estudo), iam começar a fazer faculdade. Eu estava começando a trabalhar com moda", disse.

Dani chegou com apenas 16 anos a Santos, clube que aprendeu a amar. O recomeço não tem sido fácil. A decisão da aposentadoria precoce, aos 22 anos, ocorreu próximo ao último Natal, quando voltou da última decepcionante empreitada, no Vitória de Santo Antão, em Recife.

<p>Dani foi protagonista no desfile do calend&aacute;rio das Sereias</p>
Dani foi protagonista no desfile do calendário das Sereias
Foto: Pedro Ernesto Guerra Azevedo / Divulgação Santos FC

"Foi tudo muito triste. Fui para o Palmeiras na sequência, fizeram promessas, e mal recebi. Saí desanimada. Aí, em agosto de 2012, estava em casa e o Modesto Roma (ex-dirigente das Sereias da Vila) me ligou falando do Vitória. Ele se responsabilizou, falou que me dariam bolsa em uma faculdade. Esperei dar 2013 e fui. Consegui o título pernambucano, o vice da Copa do Brasil, mas depois as coisas desandaram, ele não pôde mais me ajudar. De bom, só o meu primeiro ano da faculdade de fisioterapia", contou.

"Quando voltei para casa o meu pai já sabia, havia visto as condições em que estávamos lá. Sentamos chorando, ele falou que não queria que eu desistisse, ficou olhando um papel de parede meu jogando, disse que eu era o orgulho deles. Foi difícil. Mas mostrei para ele que, pelas condições, não dava. Ele viu tudo lá e desanimou, ficou triste. Tivemos problemas para receber o pouco, sem transporte. Não precisamos nos humilhar, estava longe dos meus pais, praticamente pagando para jogar", completou.

<p>Feliz, ainda como uma das Sereias da Vila </p>
Feliz, ainda como uma das Sereias da Vila
Foto: Pedro Ernesto Guerra Azevedo / Divulgação Santos FC

Dani diz que é constantemente abordada nas ruas e ainda tem dificuldades de explicar o motivo de estar na cidade pacata. "É difícil, digo que estou passando um tempo com os meus pais, evito sair muito na rua. Olha que sou caseira. É como chegar para o Neymar e falar para ele parar. Será que vai jogar só por amor? Para ganhar um mínimo em péssimas condições?".

A dificuldade é grande. O fim do ciclo das Sereias levou outras equipes de futebol feminino a também fecharem as portas. O time encerrou as atividades como bicampeão da Copa Libertadores da América. Dani conta que sequer conseguiu fazer o "pé de meia". Para ela, a maior conquista com o futebol foi pagar a própria carta de motorista. O dinheiro usava para comprar chuteiras e ajudar os pais.

Os trabalhos como modelo também cessaram. Apesar de ter sido usada em vários planos de marketing pelo Santos e ter ficado recentemente entre as dez finalistas do concurso Miss Recife, fez poucos trabalhos e hoje pretere a grande maioria.

"Sou modelo profissional, formada. Até me chamam ainda para fazer fotos, mas é daquele jeito. Me dão pouco, nada de contrato, tudo bem amador. Amo fotografar, sei que tenho talento para isso, mas tenho que sair, por exemplo, para Curitiba, é muito longe, não vale", argumentou.

Ainda tentou chegar ao Big Brother Brasil, maior reality show da televisão brasileira, por incentivo de colegas, mas viu o último sonho frustrado novamente. O plano era o retorno como atriz ou modelo e anunciar ao mundo as necessidades do futebol feminino. Dani Pato, ou só agora Dani, segue trabalhando para se formar em fisioterapia e voltar ao futebol, mas sem a bola nos pés.

Acompanhe os principais trechos da entrevista com Dani Pato:

Caminho sem volta?

"Para ser sincera, apareceram clubes, mas estou tão desanimada e triste que desisti. Falei com amigas de um clube que me convidaram e elas me alertaram que tudo era balela. Precisaria trancar a faculdade por nada. No Santos, lá trás, nos sentíamos profissionais, tínhamos um bom alojamento. Hoje estaria no auge da minha carreira, tinha só 16 quando comecei e um talento lindo. Tinha planos de montar um programa só meu, Programa Dani Pato, fazer faculdade de jornalismo. Se o futebol fosse sério poderia até voltar, mas já estou tirando isso da minha cabeça. Os clubes estão fechando as portas, quem tem clube feminino hoje dá só a camisa, praticamente. Não dá para viver assim. Pelo menos aqui tenho o carinho e o abraço dos meus pais".

O assédio

"Ainda continua. Sou bem caseira, não vou para festas. Saio da faculdade e vou para a minha casa, sempre digo que estou com a minha família, não falo que abandonei. Esses dias fui para Santos, passei na Sangue Jovem (uma das torcidas organizadas do clube), tiraram fotos comigo. Depois, fui no Memorial das Conquistas, olhei minhas fotos e chorei. Entrei no campo, o pessoal insistiu, me senti tratada igual antigamente. É o que sinto falta, aprendi a amar o Santos, a torcida, o grito de "da-lhe ô, da-lhe ô, Dani Pato meu amor". Não é mais como antes".

<p>Dani Pato em um de seus trabalhos como modelo</p>
Dani Pato em um de seus trabalhos como modelo
Foto: Arquivo pessoal do Facebook
A imagem

"Como eu era muito nova, fui emancipada pelos meus pais para poder vir, com 16, ganhava pouco, não cheguei a ganhar como as meninas mais importantes. Quando comecei a fazer os trabalhos par ao Santos todos ganhavam cachês e eu não tinha ninguém por trás para conversar sobre o repasse. Financeiramente, mandava um pouco para a mãe, dava alguns presentes. Paguei a minha carteira de motorista, comprava minhas coisinhas, minha chuteira".

O preço da beleza

Quando vim para o próprio Santos muitas falavam: 'aposto que está aqui pela beleza'. Algumas diziam que poderia ter caso com alguém, sempre tem, mas eu, de fato, provei que era só por talento. Se eu quisesse ir par ao lado sujo, tive propostas, poderia ser uma modelo bem sucedida, mas jamais vou perder o que os meus pais me ensinaram por dinheiro. Poderia estar em uma grande agência por meios errados. Se hoje estou aqui, na minha cidadezinha, é porque não fiz nada. Poderia estar em São Paulo com um carro bom, apartamento e postando selfies no Facebook, mas não é isso, não sou isso. O meu sonho era que o futebol feminino fosse valorizado e pudesse trabalhar com moda. Fiquei sem chaõ quando o Santos acabou".

Quase BBB

"Me ligaram e fizeram uma matéria bem legal em Recife, falaram que além de jogar trabalhava como modelo. Minhas amigas de time de lá me incentivaram a gravar um vídeo. Foi enviado, inscrito, uma pena que não tenho ele. Por sinal, quando ocorreu isso muitos falaram besteiras, uma universidade nos Estados Unidos citou algo de prostituição. Eu queria ficar conhecida por alavancar o futebol feminino, por uma mulher que entende de futebol. Se conseguisse entrar poderia me alavancar. A Grazi (Massafera) foi assim, saiu do interior do Paraná e hoje está no auge. Na minha cabeça era isso que poderia acontecer. Adoro a ideia de ser atriz, de desfilar, e ainda tentaria levantar o feminino".

A surpresa do fim

"Pouco antes do anúncio, fui com o presidente e o Edu Dracena (zagueiro e capitão da equipe masculina profissional) ao Curta Santos, um evento de curtasmetragens. Era algo do centenário. Depois, fomos jantar e ele (Luis Álvaro) me falou que tinha filhas mulheres, que apoiaria o futebol feminino, que só acrescentaria para nós já que a folha salarial era baixa e a Marta bancada por patriconadores. Aí veio a surpresa".

As outras vítimas

"Sei de ex-jogadora titular do Santos e da Seleção que parou, também. Ano passado jogou no Vitória e disse que apraria. E tem outras que tinham parado e voltaram agora, no Campeonato Brasileiro, que começou há duas semanas. Tem meninas, que eu sei, que estão esperando há quase um ano por uma cirurgia de joelho. Depois do Santos, vários times encerraram. As Sereias eram um chamariz enorme. Infelizmente, acabou com tudo, roubou o sonho de muita gente".

Tragédia anunciada

"O meu irmão tentou ser jogador, o meu pai jogou, é apaixonado por futebol. Meu pai não queria de maneira nenhuma que eu parasse, pediu que eu tentasse. Depois, foi até Recife para me apoiar (no Vitória). Lá, mostrei para ele as condiçoes e ele ficou triste. Ligava sempre para ele chorando, dizia que não tinha como mais, mas que ficaria pela faculdade".

<p>Passagem pelo Santos fez Dani Pato viver auge na carreira</p>
Passagem pelo Santos fez Dani Pato viver auge na carreira
Foto: Pedro Ernesto Guerra Azevedo / Divulgação Santos FC

Fonte: K.R.C.DE MELO & CIA. LTDA – ME K.R.C.DE MELO & CIA. LTDA – ME
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