Primeiro rival da Seleção, Exeter City busca laços no Brasil
Adversário da Seleção Brasileira em 1914, clube inglês comemora história no futebol mundial e aconselha clubes brasileiros a manter contas em dia antes de buscar sucesso
Em 21 de julho de 1914, a recém-criada Seleção Brasileira de futebol realizou seu primeiro jogo. Atuando no Estádio das Laranjeiras, do Fluminense, o Brasil – um combinado de atletas de São Paulo e do Rio – venceu os ingleses do Exeter City por 2 a 0, com gols de Oswaldo Gomes e Osman. Os brasileiros entraram em campo com Marcos; Píndaro e Nery; Sylvio Lagrecca, Rubens Salles e Rolando; Abelardo, Oswaldo Gomes, Friedenreich, Osman e Formiga.
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Do outro lado, o Exeter City do técnico Arthur Chadwick começou a partida com Reg Loram; Jack Fort e Sam Strettle; Jimmy Rigby, Jimmy Lagan e Augustus Harding; Harry Holt, Fred Whittaker, Billy Hunter, Billy Lovett e Fred Goodwin. Força intermediária do futebol inglês, o Exeter City fazia um tour pela América do Sul na ocasião, com jogos na Argentina e no Brasil.
Exeter City, de volta após 100 anos |
Passado um século dos jogos que mudaram a história do futebol mundial, o Exeter City está de volta ao Brasil. Neste domingo (20), o time encara o Fluminense, em amistoso às 10h30, que deverá reunir atletas das categorias de base dos dois clubes. A ligação do Flu com o jogo entre Brasil e Exeter é histórica. A partida aconteceu nas Laranjeiras, sede do clube, justamente no aniversário de 12 anos do Flu. Oswaldo Gomes, atleta tricolor, marcou o primeiro gol da história do Brasil. Após o jogo, o Exeter City fará um amistoso com o Tupi, em Juiz de Fora (MG). A partida está marcada para terça-feira (23), às 19h30. |
Passados 100 anos desta estreia oficial da Seleção Brasileira, o Exeter City parece esquecido no futebol britânico, em meio a tantos clubes bilionários. Mas basta olhar nas tabelas das divisões inferiores do Campeonato Inglês para ver: o primeiro adversário do Brasil está vivo e bem. Na temporada 2014/2015, a equipe estará na League Two, a quarta divisão local, ao lado de clubes razoavelmente conhecidas, como Portsmouth, Hartlepool, Luton Town e Plymouth Argyle.
Embora não goze do mesmo prestígio de clubes como Manchester United, Arsenal, Chelsea, Manchester City e Liverpool, entre outros, o Exeter City tem um grande orgulho de sua história. Afinal, o primeiro capítulo da história mais vitoriosa do futebol mundial foi escrita também pelo Exeter City há um século.
“Somos o único clube que pode dizer que joga com o Brasil em casa e fora”, brinca Bruce Henderson, diretor administrativo do Exeter City, em entrevista por telefone ao Terra. Para ele, nem mesmo a derrota por 7 a 1 para a Alemanha na Copa do Mundo do Brasil – a maior da história centenária da Seleção – é capaz de manchar a história dos pentacampeões mundiais.
“Temos muito orgulho desta conexão. Embora tenhamos visto a derrota para a Alemanha na Copa do Mundo, acho que todo mundo conhece a camisa amarela, todo mundo sabe que o Brasil ainda tem a maior história do futebol”, completou.
Aos 110 anos, o Exeter City – fundado em 1904 a partir da fusão de dois clubes – não rivaliza diretamente com os principais clubes do país. No entanto, segundo Bruce Henderson, chegar às divisões superiores não chega a ser um objetivo principal - o mais importante é estar com as contas em dias e jogando próximo dos torcedores da pequena cidade, de menos de 120 mil habitantes.
“Somos um clube pequeno, de comunidade. Não há milionários por trás. Somos únicos. Ganhamos o mundo com o nosso trabalho com a comunidade. O que fazemos é crescer em torno dos jogadores (...). Se há algo que os clubes do Brasil poderiam aprender, é desenvolver sua comunidade. Se não há uma comunidade, não há um clube. Você tem que se orgulhar de sua comunidade”, diz o dirigente. “Vivemos o que podemos bancar. Temos que viver no que temos. O primeiro é sobreviver, pagar nossas contas e sobreviver. Depois disso, podemos ir adiante com nossos jovens”, completou.
Mas enquanto o futebol brasileiro digere o vexame da Seleção Brasileira na Copa do Mundo e tenta se reinventar, o primeiro rival da equipe garante: neste sentido, os ingleses não podem ajudar muito. “Nossa seleção não foi tão bem na Copa do Mundo. Não podemos ensinar muito”, brinca, esperando que o time Roy Hodgson também aprenda algo da eliminação na fase de grupos da Copa de 2014.
Confira a entrevista:
Terra – Depois de cem anos, que tipo de ligação você vê no futebol do Exeter City e da Seleção Brasileira? Isto é, além da camisa reserva amarela do time…
Bruce Henderson - Em primeiro lugar, o clube fica muito orgulhoso de sua conexão com a história da Seleção Brasileira, do Brasil. É uma posição única na história do futebol mundial. Na verdade, na temporada 2004/2005, o Brasil enviou seu time máster para jogar em nosso centenário. Somos o único clube que pode dizer que joga com o Brasil em casa e fora (risos). Temos muito orgulho desta conexão. Embora tenhamos visto a derrota para a Alemanha na Copa do Mundo, acho que todo mundo conhece a camisa amarela, todo mundo sabe que o Brasil ainda tem a maior história do Brasil.
Terra – Durante as últimas décadas, o futebol inglês – principalmente o Campeonato Inglês – está mais aberto a outros países. O Exeter City desenvolveu alguma relação com jogadores brasileiros? Com nomes como Juninho, Gilberto Silva, Oscar...?
Bruce Henderson -Tivemos um jogador brasileiro há alguns anos, Márcio dos Santos Gaia. Ele jogou pelas seleções de base do Brasil e por nossos times de base (2002 a 2006). Ele jogou bem, pelo que eu me lembro. Gaia tinha passaporte espanhol por seu casamento e jogou para nós. Mas nós esperamos, no futuro, desenvolver uma relação (com o Brasil). Mandar nossos jovens para experiências no Brasil, e procurar jogadores com conexões portuguesas.
Terra – Quão acompanhado é o futebol brasileiro em Exeter? Não apenas a Seleção Brasileira, mas também os clubes.
Bruce Henderson - O Exeter City tem uma bandeira brasileira em seu estádio. Além disso, temos um “dia brasileiro” por temporada. Temos também estudantes brasileiros na Universidade de Exeter. E, é claro, temos a conexão de 1914. É claro que há grandes nomes, e as pessoas conhecem os grandes clubes – Santos, São Paulo, Corinthians, Fluminense, Flamengo. Mas não vemos muito na televisão. Conhecemos os jogadores brasileiros na Europa – no Chelsea, no Manchester United, na Espanha, na Itália, na França.
Terra – Com que frequência o Exeter City é procurado por torcedores brasileiros? Você se lembra de fãs específicos que procurem o clube?
Bruce Henderson - Sim, lembro. De fato, um dos nossos representantes no Brasil, Ricardo Calçado, foi um dos que primeiro conhecemos. Ele veio procurar futebol aqui. Eric Menezes (outro representante do clube no Brasil) também veio nos ver e aprender aqui.
Terra – É possível algum vínculo com clubes brasileiros, por exemplo?
Bruce Henderson - Estamos procurando nossa relação com o Fluminense, sim. Estamos trabalhando no futuro.
Terra – O futebol inglês revolucionou o mundo, apresentando exemplos de boa administração. Ao mesmo tempo, o Brasil vive um momento de transição no seu futebol. Que tipo de solução o futebol brasileiros pode importar da Inglaterra e do Exeter?
Bruce Henderson - Da Inglaterra... Nossa seleção não foi tão bem na Copa do Mundo (risos). Não podemos ensinar muito ao mundo. A Costa Rica, por exemplo, é disciplinada e tática. Temos muito a aprender com o mundo. Mas, do Campeonato Inglês, há muito o que se falar de TV. Mas no Exeter... Somos um clube pequeno, de comunidade. Não há milionários por trás. Somos únicos. Ganhamos o mundo com o nosso trabalho com a comunidade. O que fazemos é crescer em torno dos jogadores – temos uma grande academia (de categorias de base). O Brasil é um grande país, e há muitas partidas. Vocês jogam campeonatos estaduais e nacionais. Não acho que o Exeter City tenha uma solução, mas acho que, se há algo que os clubes do Brasil poderiam aprender, é desenvolver sua comunidade. Se não há uma comunidade, não há um clube. Você tem que se orgulhar de sua comunidade.
Terra – Falando desta maneira, dá a impressão que o Exeter City não tem pretensões de chegar à League One (terceira divisão inglesa), à Championship (segunda divisão) ou à Premier League (primeira divisão) nas próximas temporadas. Como o Exeter trabalha com suas metas?
Bruce Henderson - Para nós, em primeiro lugar, a meta é não termos dívidas. Vivemos o que podemos bancar. Temos que viver no que temos. O primeiro é sobreviver, pagar nossas contas e sobreviver. Depois disso, podemos ir adiante com nossos jovens. No Brasil, iremos com 18 jogadores, e você ficará surpreso de ver que eles são jovens. Depois, talvez vende-los e pagar nossas contas. Por fim, definitivamente, gostaríamos de estar na próxima liga. Vamos passo a passo.