Autuori: herói unânime do tri está desiludido com Brasil
Dez ano após levar São Paulo ao tri da Libertadores, treinador dirige time da 2ª divisão da Japão e quer distância do futebol brasileiro
Há um consenso entre os são-paulinos campeões da Libertadores em 2005: o título não viria se não fosse por Paulo Autuori no comando da equipe tricolor. O técnico chegou com a competição já em andamento e com o seu estilo calmo, que passa muita confiança aos atletas, deu ao elenco o que faltava para o time conquistar o tricampeonato. Dez anos depois, o treinador prefere se afastar do futebol brasileiro, desiludido com o cenário atual.
Autuori assumiu o São Paulo em abril de 2005, depois que Emerson Leão, campeão paulista com a equipe, decidiu aceitar uma proposta do Japão. Na visão da diretoria, era o momento de uma troca de postura: saía o exigente Leão para a entrada de um líder mais calmo, alguém que pudesse gerenciar a pressão que o time vivia naquele momento.
“A gente precisava de um treinador sereno, que fosse muito tático, que tivesse já experiência de Libertadores, um campeão brasileiro pelo Botafogo. Nas conversas todas que o Juvenal (Juvêncio, que na época ocupava o cargo de vice-presidente de futebol) fez com todos nós, o nome dele ficou como melhor para chegar naquele momento do time, com saída de um treinador forte e entrada de um treinador igualmente forte, mas com uma característica mais tranquila, para dar uma acomodada em algo que pudesse virar um conflito. Veio com uma serenidade enorme e melhorou a equipe”, conta o superintendente de futebol na época, Marco Aurélio Cunha.
E pressão era o que não faltava na época. Depois da eliminação para o Once Caldas na Libertadores de 2004, a torcida entrou em guerra com o time, exigindo resultados imediatos.
“Teve também o jogo do Paysandu, que a gente perdeu também quando voltamos. Uma crise danada, chamando o time de pipoqueiro. No jogo do Palmeiras no Pacaembu o grupo foi muito vaiado. Ali houve um momento em que o pessoal não conseguia superar o baque. O próprio Rogério foi muito criticado. A torcida estava muito maldosa”, relembra o ex-dirigente.
A pressão também ocorria dentro do elenco, como relembra o zagueiro Alex Bruno. “A gente pegou um time boliviano (The Strongest) na primeira fase, e se a gente ganha de 4 a 0, a gente não pegaria o River, ganhámos só de 3 a 0, não me esqueço disso. Ia pegar o River na próxima fase. Lembro que no vestiário ficou um clima meio tenso, porque pegar um time argentino logo de cara, mas aí veio a discussão, que não podia escolher adversário, e acabou”, conta o defensor.
A estreia do técnico na Libertadores foi exatamente na partida relatada por Alex Bruno. Autuori fez o seu primeiro jogo na goleada por 5 a 1 contra o Corinthians no Campeonato Brasileiro. A partir de então, o treinador começou a dar mais chances para peças pouco aproveitadas no elenco, inclusive o próprio zagueiro. “A toca de treinador para mim foi o x da questão. Quando o Paulo entrou, já deu para ver que o time ia longe”, relata Alex.
Outro que só elogios ao treinador é o atacante Luizão, que já tinha chances com Leão, mas se firmou de vez com a chegada do novo técnico. “Eu sou até suspeito para falar, porque é uma pessoa com quem nunca tinha trabalhado, nem conversado, e ele gostar tanto de mim assim, me dar tanta confiança... Para mim foi um dos melhores presentes da minha vida como atleta”, diz o centroavante.
Nas semifinais, Autuori ainda teve um novo desafio: substituir Grafite, um dos mais importantes jogadores do elenco, que se machucou contra o Palmeiras. A solução foi trazer Amoroso, que defende que a tranquilidade de Autuori foi fundamental para o seu rápido entrosamento.
“O apoio do Autuori foi uma peça fundamental para a minha ida no São Paulo. Foi ótimo ele me abrir porta e poder me adaptar ao grupo. Cheguei e já tinha o carinho de todos. Todo mundo me tratou com muito carinho, me deixou muito em casa para substituir o Grafite, que era peça importante na Libertadores. Aí foi fácil. Naqueles seis meses de São Paulo parece que foram 10 anos vestindo camisa”, conta o jogador.
A paciência demonstrada com os jogadores não parece ser a mesma com o futebol brasileiro. Depois de um retorno sem sucesso pelo São Paulo em 2013 e uma passagem pelo Atlético-MG no ano passado, Autuori foi para o Cerezo Osaka, do Japão, e mantém o mínimo contato com o futebol brasileiro após as últimas desilusões.
“Eu posso me dar mal, mas me recuso a trabalhar pelos próximos três pontos. O título apenas não basta para mim. Trabalho para construir alguma coisa. Quero desafios”, comentou o treinador em entrevista para o jornal O Globo em janeiro deste ano.
O Cerezo está na segunda divisão japonesa, na temporada atual, é o quarto colocado, sendo que apenas dois clubes conseguem o acesso para a divisão principal. Autuori foi contratado exatamente para reestruturar a equipe, que foi rebaixada depois de uma das piores campanhas de sua história.