No esporte por acaso, estrela do badminton rejeita rótulo de herói
- Ricardo Gomes
- Direto de São Paulo
O acaso mudou a vida de Daniel Paiola. Não fossem três sinais, ou melhor, três sérias contusões no ombro direito, e o Brasil dificilmente teria chances de entrar no mapa do badminton mundial. Natural de Campinas, Paiola, 22 anos, sempre foi um entusiasta dos esportes de raquete. Dos oito aos 14 anos, esforçou-se para emplacar no tênis, até que uma infelicidade congelou suas pretensões.
"Por conta dos movimentos repetitivos, lesionei seriamente o meu ombro. Fui a três médicos e todos recomendaram que eu parasse com o tênis. Ou era isso ou acabava deitado em uma mesa de cirurgia", recorda.
Parou com o tênis, mas não com o gosto de praticar esportes. Paiola é inquieto. Em poucos meses, arranjou um jeito de continuar ao lado de sua inseparável raquete. "Dei meus primeiros passos no badminton no Fonte São Paulo, em Campinas. Me empolguei logo de cara. Diferente do tênis, o badminton é mais coletivo, mais cooperativo. Enquanto no tênis eu viajava quase sempre sozinho, no badminton eu compartilho tudo, viagens, experiências, em grupo".
Durante quatro anos, jogou por puro entretenimento. Mas a diversão deu lugar ao comprometimento quando Paiola, com apenas 18 anos, se viu na necessidade de viajar para fora do Brasil e aprimorar o seu jogo, recurso inadiável se aspirasse vingar no badminton.
"Não era a minha prioridade. Ainda estava em dúvida sobre que curso prestar na faculdade. Mas aí surgiu uma chance de ir treinar em Portugal com o Marco Vasconcelos (ex-jogador português), que tinha três edições dos Jogos Olímpicos na bagagem. Ele era recém-aposentado e propôs me instruir gratuitamente. Não tinha como recusar".
Mas engana-se quem pensa que Paiola teve vida fácil em Portugal. Foi preciso um enorme empenho para custear sua estada por lá. Em uma conta rápida, Paiola entrega que desembolsou cerca de R$ 40 mil durante um ano, período em que durou o seu "estágio" na Europa. "A realidade na Europa é completamente diferente da que temos no Brasil. Chega a ser chocante. Lá o badminton é sustento para muita gente. Percebi que tinha nascido no país errado".
Em 2009, Paiola regressava ao Brasil "reformado". Seus golpes estavam mais afiados, seu jogo mais fluente. Enfim, tecnicamente incomparável ao tempo em que deu suas primeiras raquetadas em Campinas. "Na Europa você aprende muito da estratégia de jogo, de jogar sem cometer erros forçados. A inteligência no jogo é muito trabalhada".
Os primeiros resultados começaram a aparecer. O título em Bogotá, Colômbia, o primeiro de grande expressão, foi o divisor de águas na carreira de Paiola. Seu talento já era notável, tanto que virou figurinha cativa nos principais torneios de badminton no exterior.
Em 2010, chegou ao 62º posto do ranking mundial, a melhor colocação de um brasileiro até então. O efeito pelos bons resultados foi imediato. "Depois que você é campeão, as coisas mudam. Hoje, o COB (Comitê Olímpico Brasileiro) investe, dá todo o suporte".
O apoio da entidade máxima do esporte olímpico brasileiro colocou Paiola e mais três de seus companheiros para uma temporada de preparação na Malásia, uma das "mecas" do badminton mundial. "É a primeira vez que algo assim é feito pelo badminton brasileiro. Aqui na Malásia a fama do badminton é algo fora do comum. Os atletas daqui são tratados como estrelas, verdadeiros astros".
Em setembro, a comitiva deixa a Ásia para a disputa de torneios pelo continente americano. Os Jogos Pan-Americanos de Guadalajara, inclusive, é um dos principais desafios de Paiola. Seguro em suas previsões, o atleta admite que espera, no mínimo, duas medalhas no México. "A preparação para o Pan vem sendo intensa. A meta é ganhar uma medalha em simples e outra em duplas. Só de estar no pódio já seria um grande feito".
Além de uma participação honrosa no Pan, Paiola traça um outro objetivo ambicioso para os próximos meses: a vaga nos Jogos Olímpicos de Londres. "Tem muita coisa pra acontecer até maio (de 2012, quando se encerram os qualificatórios para os Jogos). Sou o 20º na lista de espera, mas quero continuar treinando muito, melhorando meus resultados", afirmou o 85º melhor do mundo.
Expoente do badminton brasileiro e forte candidato a prêmios no Pan de Guadalajara, Paiola não se curva à tentação do sucesso. "Não me considero herói, muito menos sonho ser reconhecido na rua. Se alguma vez servir de modelo para alguém, me sentirei feliz. Só estou fazendo a minha parte pelo badminton no Brasil".
Otimista, Paiola crê que, em menos de 20 anos, o Brasil será uma potência emergente do badminton. Tanta confiança tem um fundo de ciência. "Certa vez um técnico chinês disse que os brasileiros se tornariam os melhores do mundo simplesmente porque o segredo do badminton está nos pés, e nisso temos habilidade de sobra".