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'Aluno x professor': os diferentes rumos de Roberto Carlos e Zico na Índia

4 out 2015 - 07h35
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Neste final de semana começa a Superliga Indiana. A primeira rodada da segunda edição do torneio reservou um confronto especial entre dois ícones do futebol brasileiro. Neste domingo, às 10h30 (de Brasília), o Goa, do treinador Zico, enfrentará o Delhi Dynamos, do treinador/jogador Roberto Carlos. Se dentro de campo ambos buscam a vitória, fora dele, são objetivos diferentes em um país que ainda engatinha no futebol.

Em busca de licença da Uefa para treinar seleções, Roberto Carlos se aventura na Índia como treinador e jogador – agora em outra função no campo.

– Podia ser um jogo mais fácil, seria tão bom (risos). Tenho o maior respeito, carinho e admiração pelo Zico. Vou ficar muito ligado no que ele vai fazer no time dele durante toda a competição. Vou procurar imitá-lo. É uma pessoa que é referência na minha vida – contou o ex-lateral, ao LANCE!.

O Dynamos é o terceiro clube que Roberto Carlos dirige. Após boa campanha no Sivasspor, da Turquia, o ex-lateral foi para o Akhisar Belediyespor, do mesmo país, onde ficou até o meio de 2015. Para continuar exercendo a função de treinador enquanto busca a licença da Uefa, Roberto decidiu se aventurar no futebol indiano.

– Em janeiro tenho que fazer o curso de Pro Licence. A Superliga acaba em 22 de dezembro. Terei mais tempo para estudar. Já perdi muitas oportunidades de ir para bons clubes, não pude trabalhar em seleções por não ter esse curso.

Roberto Carlos não será apenas o treinador da equipe. No torneio, os times contam com um jogador que já defendeu grandes seleções, o chamado “marquee player“. Os donos do Dynamos escolheram Roberto para tal função.

– Estava sentindo falta de jogar. Estou legal, treino todo dia, estou jogando mais no meio-campo, fica mais fácil. O que estou fazendo é dar mais treinamento do que treinar com os jogadores. Quero que me tratem como treinador. Outro dia joguei 45 minutos, mas pretendo fazer 20, 30 minutos por jogo. Está sendo legal porque estão me entendendo e não estão me vendo como marquee player – reforça.

E quando Roberto entrar em campo, a faixa de capitão será sua.

– Falei ao Chicão que o colocaria como capitão, aí quando eu entrasse, pelo menos, por respeito, ele me devolve a faixa – completou, rindo.

Em busca de desenvolver o futebol na Índia, Zico volta a treinar o Goa

Desbravador do mundo da bola, a Índia é o nono país onde Zico trabalha como treinador. Dentre estas andanças, o Galinho teve a oportunidade de comandar dentro de campo o seu rival de hoje. Zico treinou Roberto Carlos quando ambos estavam no Fenerbahçe, da Turquia. E o ídolo do Flamengo diz que pode ter criado uma grande potência como treinador.

– Será professor contra aluno. Tomara que o aluno não tenha aprendido tanto com o professor – conta, Zico, sob risadas, ao LANCE!.

Não será a primeira temporada do ex–camisa 10 como treinador na Índia. Em 2014, Zico dirigiu o mesmo Goa e levou o clube à semifinal do torneio. Após um ano longe do clube, o Galinho não percebeu tantas mudanças como prometidas ao final da última temporada.

– O ideal é que disputasse copas, diminuísse o número de estrangeiros, porque depois do campeonato, vão todos embora. O país não pode parar dois meses por causa do futebol. A seleção indiana perdeu para Guam, uma ilha que não tem nem 100 mil habitantes. Não pode um país de um bilhão e 200 mil pessoas não ter uma grande seleção. É preciso fazer um trabalho profissional como no Japão – disse Zico.

Ainda como jogador, o Galinho levou a técnica ao futebol japonês, país que estava interessado no aprimoramento do jogo. Porém o ex-camisa 10 acha que não será possível fazer o mesmo na Índia.

– Não há esse interesse do desenvolvimento do futebol indiano. Posso ser lembrado aqui pelo desenvolvimento dos jogadores do meu time, não pelo geral. Molecada fica maravilhada no sentido de dar uma atenção separada, orientar como domina a bola, chutar. Minha preocupação é passar aqui e deixar alguma coisa, não é simplesmente ganhar dinheiro. A gente vai ficando mais velho, a experiência vai melhorando, não vou morrer com o que aprendi – desabafa o craque.

O principal problema para Zico está na má formação dos jogadores e na falta de identificação das equipes por trocarem tanto os atletas.

– Os clubes se desfazem, acabam. Os jovens não têm preparação de base. São times de aluguel. Campo, hotel, tudo terceirizado. Não tem nada próprio, mas tem uma gama de gente apaixonada pelo futebol. Assim vamos pelos torcedores.

BATE-BOLA - Roberto Carlos 

Como está a vida na Índia?

Meu dia a dia é em casa, o tempo todo no hotel. Saio para treinar e vou para o hotel. As pessoas na Índia me tratam com muito respeito e carinho. Por mais que eu não saia para ir em restaurante, pessoal do hotel me trata com respeito enorme. Aqui todo mundo ama a Seleção Brasileira, tem muitos torcedores do Real Madrid.

Você acha que será uma boa experiência profissional na Índia?

As pessoas que acham que China, Turquia, Índia, Azerbaijão, Uzbequistão são países para ex-jogadores se equivocam totalmente. São países que amam futebol e dão estrutura para trabalhar tranquilo. Vivo uma experiência muito boa, estou há dois meses aqui e o clube te dá todo apoio.

Você falou com o Zico após ter chegado à Índia?

Falei com ele em Mumbai, na apresentação dos times. Meu relacionamento com ele é de pai para filho, mais brincadeira. Não vou falar de futebol com ele. Ele já sabe como eu trabalho, e eu já sei como ele trabalha. É papo de pai para filho.

Quais são as diferenças entre ser jogador e treinador?

Treinador você fica louco. Jogador dentro do campo pode ajudar. De fora, tem que treinar, explicar, tem que dar bronca, dar responsa. Está sendo fácil porque entendem o que eu quero, são mais meus amigos. Tive grandes treinadores. O que eu pareço muito em relação ao trabalho é o (Guus) Hiddink e o (Vicente) Del Bosque.

Você tem vontade de treinar algum time brasileiro?

Se eu puder, sim. Tenho de janeiro até agosto livre. Penso em trabalhar no Brasil para ver se posso voltar depois e ficar de vez. Tive uma proposta do São Caetano, mas ainda não conversei com o pessoal de lá, mas a proposta ficou em cima da mesa. Seria legal botar o São Caetano na Primeira Divisão do Paulista e do Brasileiro de novo.

Quais foram os times que te fizeram propostas?

As seleções do Azerbaijão, África do Sul e Irã me chamaram para treinar. Fui sondado por México e Albânia. Querem levar pessoas do futebol para lá. Chegam possibilidades do Catar, China, países que necessitam a Pro Licence e eu não posso ir. 

O que você acha dessas demissões de treinadores no Brasil?

Nós temos que mudar essa mentalidade de quaisquer dois jogos perdidos mandar o cara embora. Tem que ter planejamento, fazer um time bom, com muita qualidade, aí você não perde. Porque perdeu um jogo não pode baixar a guarda, tem que tentar mudar a filosofia de quem comanda o futebol brasileiro.

Quem é o melhor treinador brasileiro da atualidade?

Tite é o treinador ideal hoje.

Qual seu grande sonho como treinador de futebol?

Daqui uns 15 anos, dirigir a Seleção Brasileira, essa é a minha meta.

BATE-BOLA - Zico 

O que tem para fazer na Índia fora do ambiente e dos horários de treinamentos e jogos?

Minha vida aqui é tranquila. Fico no hotel fazendo tudo, tem uma ótima piscina onde faço exercícios, faço também musculação. A gente tem que preparar tudo de planejamento para as partidas, três, quatro dias antes dos jogos. Ver jogo, analisar, montar vídeo para o outro jogo. Minha vida é assim, não sou de badalação. É daqui pro treino e do treino para casa. Janto no hotel, tem bons restaurantes. Talvez seria diferente em uma cidade grande.

Você já percebeu diferenças na cultura?

Totalmente diferente, a resignação deles, a humildade até exagerada em alguns momentos. É um país que vive ainda das castas, é sempre meio problemático, muita coisa poderia ser mais dividida para todos. Todo mundo se contenta com o que tem, vai à luta com o que pode, ninguém reclama de nada. Alimentação é difícil de se acostumar. Não pode apimentar a comida, o preparo já é apimentado. Se vier com pimenta, não aguenta comer.

O interesse pelo futebol na Índia cresceu após a Superliga?

Teve muita adesão, principalmente nas escolas. Vim para o draft de jogadores indianos, fui em duas escolas e é uma loucura, mais de três mil crianças com a camisa do Goa, bandeira, foto para autografar. Há uma paixão e prática muito grande.

O Lúcio é seu jogador principal. Você queria outro brasileiro?

O primeiro nome tinha sido o Adriano. Falei com os donos, queria fazer uma experiência de um mês para ver como ele estava, parte médica do tendão. Adriano até aceitou. Os caras aqui não aceitaram. É negócio, questão de passado do Adriano. As pessoas chegam até eles, algumas dão informações e os caras não querem bancar. Não depende só da gente. Eu estaria disposto a bancar. Tinha junho e julho para trabalhar com ele aí, tinha que dar carta liberatória. Não aceitaram. É um direito deles. Alguns aceitam risco, outros não. Não posso dizer porque o Adriano não está aqui. Não vejo ele com motivação para superar esse momento que ele está. Se dependesse só dele...

Mudou de ideia sobre treinar o Fla um dia? Tem vontade hoje?

Nenhuma vontade. Não quero treinar nenhum time do Brasil, não quero trabalhar no Brasil. Meu relacionamento com o Flamengo é outro. Muitos clubes brasileiros fizeram propostas, mas não deu. Não quero treinar no Brasil porque é uma opção de vida.

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