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Os dez anos de uma tragédia: a queda segundo o "vilão" Alexandre

14 nov 2012 - 08h04
(atualizado às 09h01)
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Mais do que um marco na história do Palmeiras, o rebaixamento para a Série B do Campeonato Brasileiro, em 17 de novembro de 2002, fez do zagueiro Alexandre um dos principais vilões que já passaram pelo clube. Acusado de ser o grande responsável pelo descenso, o defensor foi crucificado pela torcida e incorporou o status de persona non grata  no Palestra Itália.

Dez anos depois, o Palmeiras segue com 99% de chances de cair para a Série B do Brasileiro
Dez anos depois, o Palmeiras segue com 99% de chances de cair para a Série B do Brasileiro
Foto: Eduardo Viana / Agência Lance

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Às vésperas do trágico aniversário de dez anos da primeira queda alviverde para a segunda divisão, a reportagem conversou com o jogador, que teve a sua carreira manchada por falhas nos dois únicos momentos em que o Palmeiras não admitia qualquer tipo de erro. Bastou uma bola mal recuada contra o Flamengo, no Palestra Itália, e um corte atrapalhado ante o Vitória, no último jogo do Nacional, para Alexandre perder o "tesão" pela antiga profissão e abrir mão do seu clube do coração.

Indicação do técnico Marco Aurélio, o hoje criador de cavalos de São Pedro do Suaçuí se destacou no grupo que chegou às semifinais da Libertadores de 2001, mas foi chutado da equipe pela porta dos fundos. Ao detalhar os conflitos internos daquela época, Alexandre relatou uma áspera briga com o meia Nenê (hoje no Paris Saint-Germain), acusou o presidente Mustafá Contursi de ser omisso ao longo de sua gestão e condenou alguns dirigentes que acreditavam em uma virada de mesa para salvar o clube da degola.

De que forma você chegou ao Palmeiras?

Alexandre: Depois que sai de Portugal, eu acertei com o Cruzeiro e fui muito bem por lá. Na época, o treinador era o Marco Aurélio. Ele fez um bom trabalho em Minas Gerais e, quando foi contratado pelo Palmeiras, me levou junto para reforçar o time.

Então a sua contratação foi uma indicação do próprio Marco Aurélio?

Alexandre: Sim, o Marco Aurélio me indicou. Quando eu cheguei, ele tinha acabado de ser demitido e aí eu me firmei com o Celso Roth no comando. Mas foi através dele que eu fui parar no Palmeiras.

E suas atuações agradaram no começo. Você não largou mais a titularidade com o Celso Roth e nem com o Márcio Araújo.

Alexandre: Eu fiquei dois anos como titular absoluto. Com o Vanderlei Luxemburgo, o Levir Culpi, Murtosa, Márcio Araújo... Sempre joguei e nunca fiquei de fora no Palmeiras. Fomos bem na Libertadores, quando perdemos só para o Boca Juniors (eliminado na semifinal, nos pênaltis, em 2001), mas falhei em dois lances no Brasileiro e a torcida me marcou.

Em 2002, o Luxemburgo assume e você continua como titular. Logo de cara o Palmeiras cai para o ASA na Copa do Brasil. Algum motivo específico gerou essa derrota?

Alexandre: Eu não sei como é a situação interna do Palmeiras hoje, não sei o que acontece lá dentro. Mas, na minha época, os salários eram todos em dia. Tudo em dia, não tinha problemas com jogador e nem de grupo rachado. Acontecia que o time não ganhava. Nós nos enfiávamos para treinar em Jarinu, nesses lugares que o Palmeiras adora ir. Ficávamos uma semana concentrados e só treinando em Serra Negra, por exemplo, e não ganhávamos os jogos.

Começa o Brasileiro e o Luxemburgo deixa o Palmeiras no começo do campeonato. Isso significou o que para os jogadores?

Alexandre: Eu não consigo ver isso como um erro, mas foi logo na segunda rodada e pegou todo mundo de surpresa. Chegamos para treinar em um dia e fomos informados de que o Luxemburgo estava em uma reunião de última hora. Todo mundo confiava demais nele e na sua visão de jogo, por isso fomos surpreendidos. Depois chegaram treinadores, falaram até que o Felipão iria voltar e no fim veio o Murtosa. Perdemos três partidas diretas e daí a coisa ficou mais complicada.

Você acredita que o Luxemburgo tenha sido um dos principais causadores do rebaixamento para a Série B?

Alexandre: Eu também não vou falar que a culpa é dele. Vamos dividir toda a culpa.

Mas a torcida não dividiu a culpa...

Alexandre: O Palmeiras errou bastante e não existe esse negócio de querer colocar toda a culpa em cima de mim, de falar que o Palmeiras não teria caído se eu não tivesse falhado naquelas duas bolas. Eu me sinto injustiçado neste ponto, porque o torcedor precisa ver que o time não caiu no último jogo. Eu fiz quatro gols importantíssimos neste campeonato e ninguém vai falar. Foram erros decisivos contra o Flamengo e o Vitória, no último jogo. A torcida não esquece. Quando o time está bem ou está mal, sempre vai ter um que vai se destacar de alguma forma. Mas o Palmeiras não caiu naquele jogo contra o Vitória, e sim desde a primeira rodada. Foram erros dentro de campo e externos com a diretoria da época.

E o time se apoiava sempre naquela máxima de que clube grande não cai.

Alexandre: Falavam muito que o Palmeiras não iria cair por ser um time grande. Depois que nós perdemos para o Vitória e fomos rebaixados, um diretor do mais alto escalão entrou no vestiário. Todo mundo lá dentro estava chorando e ele veio dizendo que era para a gente parar com isso e ficar tranquilo, porque o Palmeiras jamais iria para a segunda divisão.

As polêmicas com a diretoria continuam presentes no Palmeiras. Você jogou no período que o Mustafá era o presidente. Como era a convivência com ele?

Alexandre: O Mustafá era muito fechado. Ele não tinha nenhum contato com os jogadores. No período em que eu estive lá, eu vi o Mustafá umas quatro vezes. Na hora de assinar o contrato e raramente no hotel. Só que outro dia eu estava vendo o desembarque do São Paulo no Morumbi e toda a diretoria desceu do ônibus da equipe. Presidente, diretor de futebol... Foram mais de 15 pessoas. No Palmeiras não tinha muito isso, a gente não tinha contato com eles.

Existiu algum conflito com a diretoria que comandava o Palmeiras na época?

Alexandre: Eu nunca tive problemas com dirigentes no Palmeiras e não acho que o problema seja só a diretoria. Claro que precisa haver uma mudança. Ela deveria mudar a forma de agir e trabalhar. É a hora de ter uma diretoria competente e trabalhar para o time se recuperar e subir de divisão no ano que vem, porque o rebaixamento neste Brasileiro já está praticamente certo.

O Levir Culpi foi o técnico que ficou marcado por cair com o Palmeiras. Qual é a avaliação que você faz do trabalho dele?

Alexandre: Eu vi uma reportagem do Sergião (goleiro) esses dias e ele dizia que a retaguarda era ruim, que a comissão técnica do Levir Culpi era fraca. Eu não concordo. Eu gosto demais do Levir. Ele é um p... profissional e eu também gostava muito da comissão técnica.

Com relação ao grupo. O que se passava nos vestiários do Palmeiras em 2002?

Alexandre: Nós tínhamos grandes jogadores. Tinha jogador que era pentacampeão, tinha gente da seleção paraguaia, da seleção do caramba a quatro... Era um bom time. Só que essa equipe sempre pensava em vencer um próximo jogo e isso não acontecia. Nós também não tínhamos problemas de brigas, e sim coisas normais que acontecem quando você trabalha em um grupo grande de pessoas. A imprensa da época forçava muito nesta questão, mas é tudo conversa. Nunca existiu briga entre atletas. Pelo menos não na minha passagem por lá.

Se o grupo era tão bom, por que o Palmeiras foi rebaixado naquele ano?

Alexandre: Cada um tem sua opinião na hora de procurar uma explicação. E nesse período todo após a queda eu não consegui encontrar uma. Eu estava discutindo exatamente isso com o meu cunhado. Ele me disse que o nosso time de 2002 era muito melhor que o de hoje e eu concordo. Esse time também é muito bom, mas as coisas não estão acontecendo. Nessas horas você precisa ganhar, se não complica. E o Palmeiras tem um problema maior, porque já caiu e isso ainda é muito recente. Os jogadores estão vivendo toda essa pressão neste momento e eu posso imaginar como o clima está pesado lá dentro.

O Marcos falava insistentemente sobre jogadores que não se importavam com a situação da equipe. Como era essa relação entre os atletas?

Alexandre: Uma vez eu briguei saindo de campo com um jovem que tinha apenas 19 anos na época, o Nenê (hoje no Paris Saint-Germain, da França). Nós estávamos perdendo e era para ele tocar a bola para um atacante que subiu ao ataque e podia marcar o gol. Mas ele tentou a jogada individual e nós não conseguimos reverter o placar. Na saída, de cabeça quente, eu fui até ele e chamei a atenção. Falei que ele tinha que ter tocado a bola. Ele também estava meio nervoso e me xingou. Eu fui para cima dele e nos separaram antes que a gente pudesse chegar às vias de fato. E isso deixava o clima ruim no vestiário. Um jogador ou outro não gostava da cobrança, porque não estava acostumado a jogar em time grande e não aceitava bem essa fase. Mas eram conversas e problemas que qualquer grupo de futebol tem. Seja ele profissional ou amador, todos enfrentam essas dificuldades e nós contornávamos isso nos treinamentos.

Dizem que você era um cara que a torcida odiava e todos no vestiário gostavam. Ao contrário do Nenê...

Alexandre: A situação do Nenê era exatamente essa que eu acabei de falar. Eu chamava muito a atenção. Eu assumia a responsabilidade quando o time perdia, tanto que só eu falava na saída de campo. Eu e o Marcos. Todo o resto saía escondidinho e não tinha responsabilidade com nada. Aí criaram essa imagem de que ele era mais marrento. Mas eu não tinha nada contra ele.GE.net:

Você disse que cobrava responsabilidade dos outros. Mas com o desenrolar do campeonato a pressão aumentou e você se atrapalhou naqueles lances decisivos.

Alexandre: Eu não digo nem que foi a pressão. Quando a fase é ruim, tudo sempre dá errado. O Palmeiras fez um jogo há pouco tempo com o Botafogo (empate por 2 a 2, em Araraquara), e aquele menino (o atacante Lodeiro) chutou a bola, ela acertou a trave e voltou na cabeça dele, no meio de três zagueiros. Você chuta tudo quanto é bola e ela não entra. Mas aí o adversário tenta uma vez e faz o gol. Eu tenho certeza que essa fase ruim não vai durar para sempre, mas o Brasileiro já está no fim e o Palmeiras precisaria de uma reação que eu acredito não ser possível.

Você falou sobre o empate com o Botafogo. Tem acompanhado o Palmeiras neste Campeonato Brasileiro?

Alexandre: Eu vejo todos os lances e sempre acompanhei o Palmeiras. Sou palmeirense demais. Eu gosto muito do Palmeiras e sei que o torcedor vai ficar muito bravo quando ler isso. Vejo todos os jogos e sou muito grato por tudo que eu vivi no Palmeiras.

Como é ver o Palmeiras enfrentando essa situação longe dos gramados?

Alexandre: Eu fico triste. Fico triste justamente por saber como é a paixão que o torcedor tem pelo Palmeiras. É uma equipe que amargou a segunda divisão e pouco tempo depois vai estar lá de novo. Eu via a transmissão dos jogos e as câmeras filmavam os torcedores de perto. Mulheres, crianças, todos. Eu via nos olhos a tristeza profunda. Vendo a situação, é irreversível. O time ainda tem chances matematicamente, mas eu acho muito difícil. Aquele torcedor que acompanha mesmo o time vai ficar sentido. Ainda mais com a zoação corintiana e são-paulina que vai encher o saco depois que cair.

A torcida palmeirense chegou até a ameaçar jogadores e dirigentes de morte. Você ficou com medo depois do rebaixamento em 2002?

Alexandre: Sim, eu fiquei muito assustado. Eu estava lá na Bahia e iria voltar com o grupo de Salvador para São Paulo. Mas eu fui até o (Sebastião) Lapola, que era o diretor de futebol, e pedi para ele me liberar. Fui direto para Belo Horizonte e ainda no aeroporto tive um contato com cinco ou seis integrantes da torcida. Eles tentaram me agredir, mas ninguém teve coragem de vir para cima. Eu sou grandão e eles só ficaram falando bobagens. Aí os seguranças vieram apartar e depois eu não tive mais problemas com torcedor. Eu também voltei poucas vezes para São Paulo e foi tudo tranquilo.

Hoje você mora em São Pedro do Suaçuí. Existe muito palmeirense por aí? Qual é a reação deles quando te veem?

Alexandre: A torcida do Palmeiras é muito grande por aqui. E eu sou muito respeitado por todos. As pessoas têm aquela admiração por eu ter sido jogador de futebol.

E voltar aos estádios? Você não tem mais vontade de acompanhar o futebol de perto?

Alexandre: Não, não tenho mais vontade de ir a estádios ou nada do tipo. Eu perdi a graça total. Perdi todo o tesão depois que parei de jogar profissionalmente.

O rebaixamento em 2002 ajudou para esse seu afastamento do futebol?

Alexandre: Ele ajudou. Eu ainda fui para o Goiás, tive uma grande passagem pela Ponte Preta e depois fiquei três anos no Catar. Mas a forma como as coisas aconteceram contribuiu para que eu sumisse do cenário do futebol.

Você chegou a manter amizades daquela época?

Alexandre: Eu me dava muito bem com o Marcos. Até tinha o contato de quatro ou cinco jogadores daquela época, mas acabei perdendo todos. E eu ainda moro no interior, então não tem como você manter a amizade. Minha cidade tem apenas cinco mil habitantes e eu só fico aqui na fazenda. É raro eu ir até para Belo Horizonte.

E caso o rebaixamento neste ano se concretize, você acha que a torcida vai pegar qual jogador para ser o novo Alexandre?

Alexandre: Ninguém jogou o Brasileiro sozinho. É errado você querer centralizar esse tipo de coisa. Diretoria, comissão técnica, jogadores... Todo mundo tem a sua parcela de culpa. Não tem essa de arrumar alguém para ilustrar essa campanha ruim.

 

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