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Passados mais de 20 anos, Maradona ainda é venerado em Nápoles

1 mar 2013 - 12h35
(atualizado às 12h35)
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Moradores da cidade onde craque viveu ápice da carreira e morou durante sete anos o tratam como a um santo. Primeira visita do ídolo desde 2005 resgata lembranças das glórias do clube local nos anos 80.

"O coração bate mais forte com esta notícia", diz Giovanni Durante. O napolitano de Via Forcella tem diante de si a página de esportes do jornal Cronache di Napoli, que noticia que Maradona voltaria a Nápoles a tempo para acompanhar, nesta sexta-feira (01/03), a grande partida do Napoli contra a Juventus pelo Campeonato Italiano.

Há muito tempo que o "Pibe de Oro", o menino de ouro, como carinhosamente é chamado, queria voltar à cidade onde brilhou. Maradona é acusado de sonegar impostos, e a Receita italiana cobra dele cerca de 30 milhões de euros. Na terça-feira, um dia após desembarcar na Itália, convocou uma entrevista coletiva: pediu para poder caminhar como um homem livre no país e aproveitou para dizer que foi melhor que o compatriota Lionel Messi.

Seu retorno colocou Nápoles em polvorosa. A visita é um dos assuntos mais discutidos na Spaccanapoli, a rua que atravessa toda a cidade velha de Nápoles.

"Quando ele vier, haverá uma festa extraordinária. Serão milhões de fãs nas ruas, querendo vê-lo e tocá-lo, tão grande é o nosso amor", dizia Carmine "Bruno" Alcidi. O napolitano de cabelos grisalhos é dono do Bar Nilo, na Spaccanapoli, ponto de peregrinação dedicado a Maradona, construído por ele e seu pai na década de 80.

Capela de Maradona

"Quando Maradona chegou, ficamos todos loucos. Então, pensamos em algo especial, que não havia em outro lugar e assim a Cappela di Maradona ficou conhecida no mundo todo, uma coisa única, mesmo que ela só tenha sido concebida como um pequeno gesto", diz Alcidi, com orgulho, em referência ao seu bar, conhecido até no Japão, com o santuário dedicado a Maradona.

Dentro do pequeno bar, que exala cheiro de café, cachecóis e posters do Napoli adornam o ambiente, ao lado de rolos de papel higiênico com escudos dos clubes rivais pendurados do teto. Na parede externa da casa, há um tabernáculo com imagens e relíquias, típico de Nápoles. Mas em vez de uma "madonna", uma figura de Jesus ou do santo padroeiro San Gennaro, este santuário é dedicado a Maradona. Em uma moldura dourada, há uma foto do jovem futebolista, em outra, fios de cabelo do craque argentino. Bruno Alcidi os recolheu em 1990, do acento do seu ídolo, em um voo de regresso de um jogo. Agora, eles são, ao lado de uma lágrima do campeão do mundo de 1986, parte das relíquias da "Capela de Maradona".

"Quando argentinos vêm a Nápoles, eles passam por aqui por causa dos cabelos de Maradona e até se ajoelham no chão." O santuário é hoje uma das atrações mais fotografadas da cidade, seja por torcedores ou turistas.

O salvador

"Só mesmo em Nápoles é possível que um jogador de futebol ainda seja tão amado 20 anos depois de encerrar sua carreira, como acontece com Maradona", afirma o comerciante, enquanto vai recebendo por telefone encomendas dos vizinhos.

Mas de onde vem este amor e paixão pelo argentino, que trocou o Barcelona pelo Napoli em 1984, na então transferência mais cara da história do futebol? Maradona foi a figura-chave que deu ao clube, que não colecionava muito êxitos até então, os Campeonatos Italianos de 1987 e 1990. Também venceu uma vez a Copa da Itália e, em 1989, conquistou até a Copa da Uefa.

Nascido num bairro pobre de Buenos Aires, ele não foi só ídolo do futebol, mas também desempenhou um papel social. Representou para toda uma geração de napolitanos uma espécie de salvador na luta contra o Norte rico e seus clubes, Milão e Turim, um redentor que tirou a cidade da crise.

"Especialmente na década de 80, Nápoles era considerada pelo mundo apenas um palco da guerra da máfia. Com Maradona, isso mudou, porque através dele um outro retrato de Nápoles foi criado", sublinha Alcidi. "Por isso, somos muito gratos a ele e o amamos ainda hoje."

Quando questiondo se Maradona também não deve ser criticado, especialmente por causa de seus problemas com a Receita e casos de doping e drogas, ele responde de forma clara, quase irritada.

"São as coisas que acontecem, que podem acontecer a qualquer um no mundo. Esse lado negativo não me interessa. Ele permanece para sempre em nossos corações, não importa o que aconteça", afirma.

Também em Via Forcella, um local notório de venda de drogas e da Camorra, no centro, ninguém gosta de lembrar os pecados de Maradona. Como é o caso de Giovanni Durante, cuja filha de 14 anos foi morta a tiros pela máfia e, desde então, tenta tirar do crime jovens napolitanos com um centro cultural.

Solidariedade incondicional

"Estamos sempre do lado de Maradona", ressalta. Tanto faz se o assunto é o processo por causa da paternidade e manutenção para seu filho ilegítimo, que está vivendo nas proximidades de Nápoles ou sobre suas histórias com drogas. Quando há alguns anos Maradona estava à beira da morte num hospital, por causa de abuso de cocaína, álcool e por sua obesidade, Durante enviou a Buenos Aires uma fotografia da sua filha morta, com um recado dizendo que ela o protegeria como o anjo de Nápoles.

Essa é apenas uma de muitas histórias que há para se contar desta cidade fervilhante nos arredores do Vesúvio. O sucesso do Napoli nesta temporada, ocupando o segundo lugar, atrás do líder Juventus, e o retorno do grande ídolo dos napolitanos dá esperanças a torcedores, à cidade e traz de volta as recordações dos gloriosos anos 80.

Deutsche Welle A Deutsche Welle é a emissora internacional da Alemanha e produz jornalismo independente em 30 idiomas.
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