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Olimpíada 2016

Festa de abertura emociona com uma visão lúdica das favelas

6 ago 2016 - 11h28
(atualizado em 22/8/2016 às 12h59)
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Um repórter do jornal espanhol Mundo Deportivo escreve ao meu lado: "de la samba al funk, la favela hace bailar al Maracanã." Ele desenvolve o texto com rapidez e fluência e, até onde meus olhos alcançam, enaltece o que há de lúdico nesses locais. Cita a dança, a música, a arte. Juan Justribo tem razão. E eu vou mais adiante, após fixar os olhos na credencial dele para identificá-lo antes que um dos dois saia da tribuna de imprensa. Jamais a favela, carioca ou não, foi tão reverenciada como na festa de abertura da Olimpíada, vista por 3 bilhões de pessoas.

Abertura da Olimpíada Rio 2016
Abertura da Olimpíada Rio 2016
Foto: Getty Images

Anfitriã da noite de sexta (5), a favela pontuou a bela cerimônia que teve vários momentos emocionantes no Maracanã. O primeiro, e marcante, juntou dois símbolos do País – o hino nacional e Paulinho da Viola. Encaixaram-se com perfeição e elegância, acompanhados pela voz de dezenas de milhares de pessoas.

Mas, antes do autor de Foi um Rio que Passou em Minha Vida se apresentar, a homenageada do evento já se fazia presente na canção que deu início ao espetáculo (Aquele Abraço), em que Gilberto Gil manda um “alô” para “a moça da favela” e exalta o bairro pobre de Realengo, da Zona Oeste da cidade.

Em tudo isso, há uma mensagem clara de tolerância, respeito à cidadania e de valorização da autoestima. A resposta do público aos poucos combate a incredulidade e se materializa após a modelo Gisele Bündchen desfilar pelo palco, ovacionada, ao som de Garota de Ipanema.

Abertura da Olimpíada Rio 2016
Abertura da Olimpíada Rio 2016
Foto: Ezra Shaw / Getty Images

Quase todos de pé, insistem em desafiar a lógica social que impede o acesso de muitos ao evento em razão do preço dos ingressos. Moças do corpo dourado e rapazes com dragão tatuado nos braços pulam e cantam o Rap da Felicidade e o refrão “eu só quero é ser feliz, viver tranquilamente na favela em que eu nasci” passa a ser o hit da noite.

O megaevento esportivo se transforma ali numa ilha de fantasia. Mas quer ir além. Faz um apelo a favor do meio ambiente ao alardear o aquecimento global. Em cena, um menino perdido num labirinto de paisagens áridas, com milhares de prédios descoloridos. Ele encontra a saída e se depara com uma pequena muda que nasce do asfalto – uma alusão ao poema A Flor e a Náusea, de Carlos Drummond de Andrade.

Pira
Pira
Foto: Christian Petersen / Getty Images

A esperança também remonta ao Brasil indígena e à escravização de africanos – temas abordados com a visão crítica que lhes são indispensáveis. A história do País é contada em coreografias, e em mosaicos que surgem de efeitos especiais de iluminação. Quando anoitece no planeta Maracanã, estrelas surgem em profusão – celulares e smartphones acendem e flutuam sobre cadeiras e arquibancada.

Há discursos protocolares de autoridades e o presidente em exercício Michel Temer recebe uma vaia estrondosa. Nada que ofusque a alegria de quase 70 mil pessoas ansiosas em saber quem vai acender a pira olímpica. Elas viajam na reedição do voo do 14 bis, que atravessa o estádio suspenso por um cabo, e aplaudem a apresentação dos atletas.

Os dos países sul-americanos e os de Portugal, França, Itália, Alemanha e EUA são recebidos com entusiasmo. Cubanos e mexicanos não ficam atrás. Antes da apoteótica passagem dos brasileiros, outro instante comovente. O time olímpico de refugiados arrebata o público no Maracanã. Atletas se emocionam e acenam com lágrimas.

Guga com a tocha na abertura da Olimpíada Rio 2016
Guga com a tocha na abertura da Olimpíada Rio 2016
Foto: David Rogers / Getty Images

Caetano Veloso, Gilberto Gil e a cantora Anitta ocupam o palco e contagiam ainda mais a plateia com Sandália de Prata, de Ary Barroso. O auge da festa está próximo e a bateria de 12 escolas de samba do Rio prepara o caminho de Gustavo Kuerten, o Guga. Os telões mostram o ex-tenista conduzindo a tocha num dos acessos do Maracanã. Ele a passaria em seguida para a rainha do basquete, Hortência. Mas o revezamento não terminaria ali.

Vanderlei Cordeiro de Lima, o ex-maratonista medalha de bronze em Atenas (2004), está a poucos metros da pira e recebe a chama olímpica. É o reconhecimento pelo seu fair-play, sua contribuição ao esporte e à grandeza do gesto de perdão. Naquela olimpíada, ele liderava a prova, quando o ex-padre irlandês Cornelius Horan entrou na pista e o agarrou. Ainda assim, subiu ao pódio.

Vanderlei Cordeiro acendeu a Pira e deixou o público extasiado
Vanderlei Cordeiro acendeu a Pira e deixou o público extasiado
Foto: Elsa / Getty Images

Filho de lavradores humildes, um casal de retirantes nordestinos que fugiu da seca, Vanderlei nasceu e cresceu pobre, na cidade de Cruzeiro do Oeste, no Paraná. Coube a ele acender a pira dos Jogos Olímpicos de 2016. Do meu lado, já fechando o laptop, o jornalista espanhol comenta a honraria. “Tinha mesmo de ser o Vanderlei. É o brasileiro que mais simboliza o espírito olímpico na atualidade. E tem uma história de vida de sofrimento e superação, fantástica." 

Fonte: Especial para Terra
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